sábado, 30 de outubro de 2010

Minhocações e besouragens

Acabei de reler pela 3 vez As Meninas, da Lygia Fagundes Telles e não resisti em pegar emprestado as expressões acima.

Estava lendo um post da Lola que falava sobre aqueles que são preconceituosos por enxergar o preconceito em tudo. A posição da Lola não é essa, ela só estava respondendo uma crítica que recebeu. Eu, como estou infurnada em casa trabalhando à beça fiquei pensando "Será que o mundo mudou e eu não vi?". Eu bem que queria viver no mundo de algumas pessoas onde todo mundo é feliz e não existe pobreza e injustiça e todo mundo que rouba é mau e merece ir para o inferno. Quem usa drogas é fraco e merece morrer tbm. Naquele mundo onde as mulheres podem tudo, até serem presidentes. Ai ai! Ia ser mesmo uma beleza.

Talvez esse mundo exista, mas é um universo paralelo ao nosso, como naquelas historinhas em quadrinhos. Gente, esse mundo não é aqui, muito menos no Brasil. Vou falar do que eu entendo, que é sexismo. Porque eu sou mulher, né. Recentemente tive um problema com a imobiliaria que aluga o apê pra mim e bom, tinha umas coisas duvidosas no contrato e fiquei com medo do cara se aproveitar. Ele quis aumentar o aluguel ano passado injustamente, e o maridão caiu na conversa pq o cara disse que se ele aumentou com o índice negativo, o maridon podia negociar um aumento mais baixo quando o índice estivesse em alta. Aconteceu isso esse ano, o índice em alta e, bom, pensamos em negociar. Mas o maridão queria que eu falasse com o cara pq sou menos flexivel e o cara é um bronco. Bom, o cara se ofendeu de estar sendo contestado por uma "mulherzinha", ofendeu meu caráter e tudo só porque eu exigi q ele falasse com o proprietário sobre a nossa recusa em aceitar o aumento. Acho q ficou puto porque eu disse "Não quero saber o que você acha que o proprietário vai falar, quero que fale com ele." O cara não falou. Me ligou 10min depois com uma conversa fiada, mas eu não queria discutir e contactei meu advogado. Olha a resposta que recebi dele sobre como proceder ao devolver o apartamento para não ter problemas:

Quanto aos defeitos, vc deve notificar a imobiliária por escrito exigindo a reparação, sob pena de levar o caso à justiça. Tire fotos, chame o porteiro e o sindico pra ver. Eles poderão testemunhar a seu favor mais adiante.

Quando vc tiver de saída, observe o que diz a cláusula XVI. Este povo é chato mesmo, tem de dar duro, comparar a vistoria inicial com a final e discutir muito. Não vá só, vá com seu marido ou outra pessoa, de preferência homem.
Não é discriminação, é verdade, eles abusam da compreensão e da fragilidade feminina.

Além disso, em regra, o que eles (imobiliária) conseguirem tirar de vc em excesso é deles, ou seja, muitas vezes eles enganam o proprietário e o locatário.


Não é preconceito não, minha gente. Apenas meu advogado me ensinando como as coisas são. Eu posso dizer que é normal devido ao fato das mulheres não serem afeitas às coisas práticas ou ao mundo dos negócios. Mas olha só, eu já morei só com uma amiga, e o contrato de aluguel estava no nome da minha mãe (se não me engano, uma mulher). Minha mãe, embora não boa administradora, cuida dos seus bens melhor do que o meu pai cuidava. Tem uma casa própria e um automóvel. E ela é uma mulher só. Minha tia, irmã da minha mãe está na mesma situação e ainda tem um apartamento na praia. Ambas foram "trocadas" por outras por seus maridos, sustentaram as famílias e terminaram de criar os filhos. A maior parte das minhas amigas, compra carros no seu próprio nome. Tenho uma que tem um apartamento quase quitado no seu nome. Outra, recebeu de herança um da mãe, que aluga para complementar as despesas de sua vida em outro país. Essa última acho que é a única que não cuida pessoalmente dos negócios pq seu pai é vivo e como quando a mãe dela morreu e ela era muito nova para cuidar das finanças, virou hábito. Além do mais, ela confia no pai.

Tenho amigas mais velhas que cuidam dos filhos, dos ex-maridos, dos pais e etc. Onde está a fragilidade? É claro que eu entendi o que o advogado quis dizer. Que as imobiliárias enrolam até os homens, quiçá as mulheres, que parecem naturalmente mais despreparadas? Mas eu realmente não concordo. Acho que acontece o que aconteceu comigo ao argumentar com o proprietário da imobiliária - orgulho ferido. Como uma mulher pode discordar ainda de um jeito petulante? É, eu fico petulante quando sei que estou certa (é raro eu achar que estou certa). Mas é que eu penso, se a lei está do meu lado, porque tenho que "puxar o saco" de quem deveria estar pedindo desculpas? A verdade é que o homem não me deixou nem terminar de falar. O orgulho dele ficou tão ferido que disse que eu poderia sair do apartamento naquele mesmo mês que não cobraria multa, que se sentiria avisado sobre a saída. Pensa se eu vou fazer isso com um destemperado desses? Claro que quando eu sair vou avisar direitinho, porque a vontade dele me ferrar vai ser enorme depois da contestação. Mas enfim, pode parecer uma coisa boba, se é, porque o advogado fez questão que colocar em negrito no e-mail?

Tenho outro causo que aconteceu tbm comigo que já nem me lembro se contei. Mas quando o meu pai faleceu, já tinha vendido umas terras que tinha pelos interiores de Brasília. Mas como tudo do meu pai é enrolado, tinha gente morando nas terras. Talvez ele tenha feito um acordo com o proprietário para essa gente continuar lá. Como a gente não consegue falar com o comprador, tentamos falar com o povo que mora lá. Eu estava encarregada do inventário de mi padre. Fui com o meu irmão pq não tenho carro. Enfim, eu tbm vivia indo naquelas terras com o meu pai e aquelas pessoas me conheciam tanto quando ao meu irmão. Começamos a prosear, tomamos vários cafés, vimos várias galinhas e começamos a contar o problema para aquelas pessoas. Aquele terreno não pode ser loteado. Tínhamos que fazer um acordo entre o comprador e eles e queríamos fazer algo formal para deixá-los amparados. O meu irmão nunca chega no assunto. Eu fui direto pq não aguentava mais beber café - vcs tem algum documento da terra? Todos tinham. Posso ver? Ninguém deixou. O meu irmão pediu, ninguém deixou, mas eles não falaram comigo. Só falavam com o meu irmão. Eu dizia uma coisa, ninguém respondia, meu irmão repetia o que eu havia dito, eles falavam. Não gente, não estamos no Oriente onde homens não negociam com mulheres, estamos no Brasil.

Agora, se isso não é preconceito, alguém pode me explicar qual é o nome da coisa que eu tenho que combater?