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quinta-feira, 16 de maio de 2019

Dor e a dor de ser professor - parte 1

Devido ao tamanho, esse post será dividido em duas partes.

Eu sempre quis ser professora. Desde criança, dando aula de mentira para amigas e bonecas até nos trabalhos de escola onde eu era intimada a falar em público pelos grupos, que achavam que eu era boa de oratória. Nesse sentido seguiu a minha formação. Entre assumir um sonho e desempenhar um papel sofri bastante. Primeiro pelas pessoas que me diziam, "Mas você é tão inteligente! Porque não faz um concurso público?" 

Todo mundo acha melhor fazer um trabalho entediante em troca de um bom salário no final do mês. Eu já trabalhei na iniciativa pública e nunca gostei do serviço. Nada contra, mas não era pra mim. Pode ser que eu não tenha achado a posição certa, mas a gente só vive uma vida e a minha se desenhou dessa maneira. 

Durante muito tempo o processo foi de aceitação. Eu dava aula durante a graduação e dizia para mim mesma que era só para me manter até eu me formar. Já pensava em fazer mestrado e fui aceita em um programa em Lille, na França. Nada relacionado ao ensino. Mas não fui. Meus pais não tinham como me manter lá, mesmo eu dizendo que podia trabalhar para me manter.

Minha mãe ficou com medo de não ter como pagar nem para eu voltar pro país caso as coisas dessem errado. Meus pais não falavam francês, nunca haviam saído do país e nós não tínhamos nenhum amigo ou conhecido na França. Paralelamente as aulas continuavam. Cada vez mais gente me procurava e eu não tinha tempo para encaixar os alunos. Eu cheguei a dar aula em 3 escolas ao mesmo tempo. Trabalhava tanto, que não tinha tempo para preparar aulas ou estudar. Tive que comprar uma moto para me locomover, pois do contrário, gastaria todo o meu salário em transporte. Mesmo assim eu continuava repetindo para mim mesma que isso era temporário. Tirei minha segunda habilitação para aumentar meu leque de atuação. Era agora formada em Letras Francês e Português. 

Foi um alívio momentâneo. Pensei que poderia então passar num concurso e dar aulas no GDF. O salário era relativamente competitivo em relação à iniciativa privada e eu teria coisas que nunca tinha tido antes: 13º, férias, carteira assinada... Cheguei a passar em um concurso para minha primeira área, mas como ainda estava na graduação, não consegui a pontuação necessária no currículo. Fiquei em sexto lugar de cinco vagas. Depois que eu me formei eu simplesmente não conseguia tempo para estudar. Tinha que fazer para a área de Língua Portuguesa, que não era parte do meu cotidiano. Além disso, as nomeações estavam uma confusão. Tinha gente para ser nomeada quando abriam outros concursos, greve. A situação não era muito convidativa.

Durante esse tempo que trabalhei em escolas privadas eu vi de tudo. A profissão de professor de língua estrangeira não é regulamentada. Isso quer dizer que uma pessoa com qualquer nível superior pode dar aula de língua. Contrariamente a isso, eu tinha uma licenciatura em língua e literatura francesa. Aprendi inúmeras coisas na graduação. Até traduzir um texto do francês antigo para o moderno. Fiz aula de expressão oral e escrita em língua francesa. Tive muitos professores de outras nacionalidades, suíços, franceses, brasileiros que viveram muitos anos na França e etc. Até um estágio de imersão eu fiz, pois ganhei uma bolsa do governo francês. 

Mas eu conviva com colegas que não eram professores, muito menos formados em letras. Não sabiam o que era a forma nominal do verbo. Algo muito útil de saber, pois os alunos brasileiros sempre se enrolam com tempos verbais compostos. O que mais me marcou foi uma colega francesa. Nós dávamos aula numa escola pequena e a dona me pediu para escolher o método de francês. Eu escolhi um bastante comunicativo, com um pequeno foco na gramática. Bem dentro da abordagem que estava (e ainda está) em voga no momento, a abordagem comunicativa. A francesa veio trabalhar logo depois na escola e vinha reclamar com um ar de superioridade a respeito do método. Muitos professores que eu conheci tinham dificuldade com ele, pois davam aula de LE do mesmo jeito que tiveram aula na sua língua materna, aula de gramática. Em sua maioria, esses professores não eram formados em Letras, muito menos tinham uma licenciatura. Ela não sabia usar o método. E era bem o boom do “professor nativo”, então, para ajudar a dona da escola, de quem eu gostava muito, me ofereci para ajudar os professores com o método.

A aula (ou ateliê) quase acabou em briga. A francesa se concentrou em testar meus conhecimentos e como não conseguiu atingir seu objetivo, começou implicar com qualquer coisa, inclusive minha tentativa de usar o “tu” para expressar que éramos colegas e aquele ambiente era seguro para expor qualquer dúvida ou insegurança. Além disso, foi um fiasco tentar explicar para a francesa que ela só precisaria explicar a regra gramatical, caso o aluno não conseguisse entendê-la naturalmente. Ela achava super importante explicar todas as conjugações verbais na primeira aula. Outra coisa que ela não conseguia entender era porque os alunos brasileiros tinham dificuldade para entender qual o auxiliar usar no passé composé. Ao mesmo tempo, explicar que coisas no método poderiam ser ignoradas, como a diferença entre o fonema [p] e [b], claramente colocada ali para os hispano falantes. Mesmo assim, naquela escola, e em muitas outras onde trabalhei, o meu salário, independente da minha qualificação, era igual ao desses professores. Mesmo que eles não soubessem preencher um diário ou fazer um plano de aula. 

Somava-se a isso o fato de eu sempre ganhar por hora. A hora da aula que eu dei e não a que eu preparei. Pode parecer estranho, mas o professor não chega na sala de aula e tira milagrosamente analogias e piadas da cabeça. Aquela musiquinha que encaixa tão bem com o conteúdo da aula, tudo aquilo foi planejado. E um professor recém-formado leva entre 2 a 4 horas para preparar uma aula de 45 minutos. Dependendo do assunto, se for algo que ele não gosta e/ou não é muito bom, o tempo que ele vai passar estudando e preparando aumenta. Eu, por exemplo, gosto muito mais de literatura do que de qualquer outra coisa. Infelizmente, quase nunca tenho a oportunidade de juntar o “útil” ao agradável. Até porque, na maioria das vezes, meu público só lê Harry Potter. Então, até hoje, quando tenho que explicar o 3 groupe (ou a terceira conjugação), perco algumas boas horas estudando e pensando novas maneiras de abordar o assunto. 

Isso sem contar as provas. Elaborar prova é sempre um martírio para mim. Achar um texto no nível certo com o vocabulário que meus alunos possuem é quase um milagre. Na maioria das vezes eu mexo no texto para ficar mais “A1” ou “B2”. E os áudios para as partes de compreensão oral? Quando eu trabalhava sozinha, quase sempre tinha que usar alguma faixa do próprio método fornecido pela escola. Não tinha essa de internet em sala ou achar no torrent. Hoje, felizmente é muito mais fácil encontrar um áudio livre de direitos na internet. Mas mesmo assim, ainda é preciso muita pesquisa para que ele se encaixe no arcabouço dos alunos.

Além disso, tem a rotina de correção de provas e trabalhos. Reuniões e mais reuniões. Temos que nos manter atualizados. Cursos, seminários, simpósios. Coisas que quando eu estava na iniciativa privada eram pouco valorizados. Quanto maior a sua qualificação, pior para escola, afinal, terá que te pagar mais. Mas se engana aquele que pensa que a coisa está fácil no sistema de ensino privado.  

Quando comecei a dar aula, era muito mais uma questão de QI do que qualquer outra coisa. Ou no máximo um boca a boca. Uma vez que você estava dentro das escolas, poderia fazer sua fama a assim almejar trabalhar naquelas que pagam bem. Quando ia às entrevistas, na maioria das vezes bastava ter um bom currículo, ter estudado em boas escolas. No meu caso não funcionava. As pessoas achavam que pelo fato de ter experiência dando aula de línguas, eu não conseguiria cuidar de uma turma de português, por exemplo.

Eu cheguei a trabalhar no ensino de Língua Portuguesa. Uma escola que só fazia propaganda e entregava muito pouco para pais e alunos, usa inclusive o nome da UnB disfarçado para atrair mais alunos. Afinal, convenhamos, quem vai pagar alguns mil reais para colocar seu filho numa faculdade privada? Hoje descobri que está sendo processada por dívidas trabalhistas. Mas o que era pior na escola era a rotatividade dos professores que impediam qualquer projeto pedagógico. Como a hora/aula era muito baixa, a maioria dos professores trocava de emprego assim que podia. Mas dos alunos, o valor cobrado era exorbitante. Dois alunos e meio serviam para pagar o meu salário, mesmo eu trabalhando os dois turnos. E cada sala tinha em média 30 alunos. Sim, senhor presidente, nós sabemos fazer essa conta básica...
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quinta-feira, 17 de março de 2016

Considerações sobre a esquerda e os recentes acontecimentos

Eu estou aqui, na frente desse computador agora, tentando entender o que está acontecendo. Mais cedo liguei para um amigo perguntando se em Brasília o estardalhaço era o mesmo. Parece inacreditável. É engraçado pra mim lembrar que em 2013 eu estava na Esplanada dos Ministérios, vendo os jornalista da Globo acompanharem a manifestação de dentro de um helicóptero, sem poder descer e obtusos a ponto de se restringirem a contar o número de lixeiras depredadas (eles, os únicos que acham as lixeiras nas ruas) e os vidros quebrados para apurarem, com imparcialidade, quem eram os manifestantes.

Eu estava lá, esperançosa, pensando "dessa vez vai". Um movimento legítimo, apartidário... Mais um grande arrependimento para entrar na minha lista. Muita gente falava que essa coisa de não poder levar bandeira de partido era na verdade uma hostilização da direita contra a esquerda. Eu não conseguia enxergar nada disso. Se eu soubesse no que isso ia desencadear teria saído do clima antes do Passe Livre. Mas enfim. Agora acho que só me resta do desabafo.

Não sou petista. E hoje em dia parece que essa informação é essencial para que meu texto seja de alguma forma lido. Mas já fui. De ter botton, bandeira e camisa. Estava na marcha dos 100 mil, no Fora Collor, e votei no Lula e na Dilma. Mas digo que só votei no Lula no primeiro mandato e na Dilma porque ela é mulher. Posso explicar posteriormente porque não me mantive petista, mas para mim, ver Lula aliado com Sarney bastou para saber que o partido estava corrompido. Mas acho que eu tenho o direito de falar. Todos temos o direito de opinar. Mas digo que o PT foi corrompido porque sempre teve uma ideologia forte e sólida, já não colocaria minha mão no fogo pelos outros partidos. Felizmente, mesmo no poder ainda fez mais pelo social do que qualquer outro. Infelizmente para mim, não acabou com as estruturas estruturantes de desigualdades do nosso país.

Mas o que vejo hoje nas manifestações, elevadores e ruas é que estamos acuados. Todos que pensem um pouco mais além de "morte ao PT", "fora Dilma", são automaticamente suspeitos. Suspeitos de quê eu não sei bem. Tenho medo de me pronunciar publicamente. Estou aqui, realmente escondida na rede. Não é mais uma manifestação apartidária, é basicamente uma manifestação anti um partido e contra toda a ideologia de esquerda. Eu posso não concordar com o PT, mas sou obrigada a defendê-lo em muitas coisas que estão acontecendo simplesmente porque defendo o processo democrático. Louco isso, não? Tem gente que me fala, "Mas então você não quer que eles sejam punidos"? Sim, eu quero. Mas pelo quê? Temos provas? E vamos mais além um pouco: uma vez que os petistas saírem de cena, a investigação vai continuar?

Outro motivo pelo qual me dispus a escrever esse texto. Lembrem-se de Collor. Lembrem-se dos 8 anos de FHC antes de vociferarem contra o PT. Infelizmente a direita não foi capaz de ganhar. O sistema eleitoral está corrompido. Certamente. Mas não são as urnas o problema. São os financiamentos de campanha, os partidos, a legenda. Mas não queremos mudar isso. Não estamos nas ruas clamando por reformas. Estamos nas ruas distribuindo nossos ódios e preconceitos, felizes de podermos falar nossas barbaridades e achando que não estamos sendo julgados e nada irá nos atingir.

Meu desabafo aqui reside porque tudo que eu acompanhei ao longo dos anos como uma luz bem pequena aumentando paulatinamente no fim do túnel, está sendo levado e esfumaçado pelas fogueiras que se acendem contra o vermelho da esquerda. E a utopia de que as coisas podem ser conseguidas democraticamente parece ter dado um soco na minha cara. Estamos perdendo tudo, inclusive a liberdade de dizermos o que pensamos (lembrem-se do "Desculpem a nossa Falha"). E olha que não estamos usando essa liberdade para incitar o ódio, promover o estupro, a violência, o racismo. Mas mesmo assim somos odiados por tabela. Parece que um partido de esquerda fazer o que todos os outros fazem é motivo para odiar todo mundo que é de esquerda, mesmo que não sejam do partido e que não concordem com o que está acontecendo.

Eu nunca acreditei que a História pudesse se repetir, mas hoje não consigo ser mais tão cética quanto a isso. Qual o problema de defender a igualdade social? De defender a igualdade de gênero? As cotas? Pode me dizer o que quiser, que é a favor de tudo isso, mas se eu sair às ruas de vermelho, porque vermelho é sim a cor da ESQUERDA, pode ser que você mesmo me hostilize.

E o mais engraçado é talvez que nós, da esquerda, queremos mais ou tanto, o fim da corrupção. Mas não seja ingênuo. Como tem gente que defende que um campeonato roubado vale como qualquer outro no futebol, tem gente de esquerda que defende isso e de direita TAMBÉM.

Só gostaria que essas opiniões diferentes fossem respeitadas e que no fundo as pessoas soubessem que os veículos de informação de direita defendem a direita. Parece um pouco óbvio, mas não é. E no fim, acho que vou tentar dormir, já que as buzinas se acalmaram.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

A maternidade empodera mulheres?

O problema dos conceitos é que eles podem ser estendidos até a exaustão e podem também acabar perdendo o sentido, ou se esvaziando, se preferirem.

A palavra empoderamento me é muito cara. Lembro bem do meu caro amigo Davi Miranda querendo retirá-la da minha dissertação por não constar no VOLP. Claro, depois que eu expliquei que era um conceito do feminismo e que ele poderia deixar o empoderamento quieto no texto, ele concordou. ;)

Empoderar não tinha um equivalente em português e foi uma tradução do termo em inglês empowerment. Não é o mesmo que dar poder e por isso não pode ser substituído pela expressão. Quando vc dá poder, cede algo que é seu a alguém. Como a mãe que no desespero para fazer o filho se comportar pega emprestada a autoridade do pai e diz "se vc não se comportar eu vou falar para o seu pai". Ela mesma não tem autoridade e precisa invocar a figura paterna para que o filho a obedeça.

Por isso, no intuito de fazer mulheres como essas e grupos minoritários terem eles próprios poder, cunhou-se o termo. Empoderar é dar meios ou acesso aos meios para que os grupos desempoderados possam ter acesso ao conhecimento e mecanismos que possibilitem a tomada do poder. Coisa linda!

(In)felizmente muitas mulheres apenas tomam conhecimento desse termo pelo parto humanizado ou pela maternagem. É bom pois assim elas tem a possibilidade de fazer com que seu parto seja algo humano e uma escolha própria, e não uma prescrição médica autoritária. Mas é ruim porque muitas vezes passa a ideia de que somente a maternidade é capaz de empoderar uma mulher.

Agora que eu sou mãe, talvez possa falar às minhas colegas de pós-graduação que a maternidade é sim uma condição que reúne mecanismos de empoderamento feminino. Mas também ela pode ser travestida de um discurso empoderador e no fim, continuar responsável pela inexpressiva participação da mulher na sociedade.

É um tema bem complicado e eu confesso que nem tenho mais opinião formado sobre o assunto. Tenho sim algumas reflexões. Uma coisa que eu tento optar, sempre que tenho dúvida, é pelo meio termo. Claro, nem sempre é possível, mas ajuda muito.

Digo isso porque vejo algumas amigas mães tentando ser a mulher maravilha. Eu já assumo logo que não tenho super poderes e vou ser feliz comigo. Por exemplo, eu não tenho o poder de ir ao banheiro com o meu filho no sling. Não tenho o super poder de ficar com ele horas no colo pois minha mão fica dormente. Não tenho o super poder de adivinhar de imediato todas as necessidades dele e ele chora. Não tenho o super poder de me multiplicar e cuidar da casa e do desenvolvimento emocional, físico e motor do meu filho. E principalmente não tenho o poder de ser a melhor pessoa para ele o tempo todo. As vezes o colo do meu marido é mais gostoso, o banho dele é melhor e as vezes ele está mais descansado e tranquilo para tomar uma decisão sobre ele ou nós tomarmos em conjunto.

Eu acho lindo criação com apego, mas acho um pouco complicado na nossa sociedade. Não li muito a respeito, mas me dá a impressão de ser mais uma cobrança para a mãe. Aliás, eu adoro o pediatra do meu filho, mas toda vez que ele me diz que é uma maravilha para o meu filho eu estar desempregada pois além de eu ser responsável pelo desenvolvimento do meu filho com a amamentação eu sou importante também pelo desenvolvimento psicológico dele, eu tenho vontade de mandar o doutor às favas.

Todo o contato que o meu filho tem com o mundo é importante para o desenvolvimento psicológico dele! Esse discurso é muito freudiano. É como aquela passagem que ele diz que basta a mãe colocar uma foto do pai na parede e apresentá-lo a criança que seu papel na criação está feito. O que é importante não é a quantidade do contato e sim a qualidade. Se eu estou me matando para cuidar dele e frustrada não vou ter um contato tão bom como aquele da mulher que está bem consigo mesma, mesmo que tenha pouco tempo para ficar com o filho.

E falo que tempo para ficar com o filho não é uma escolha na nossa sociedade brasileira. Uma mulher que abdica da sua carreira para ficar com o filho nem sempre toma a melhor decisão, pois corre o risco de, lá na frente, quando o filho estiver criado, ter um vazio enorme na vida. Mas estamos chegando ao ponto de termos apenas duas escolhas: ou você tem filho ou você trabalha. E o pior, nenhuma dessas escolhas te faz ter o respeito da sociedade, por mais que se diga que mãe é a coisa mais importante do mundo e etc.

Se vc abdica da sua carreira para ser mãe, fica na dependência financeira do marido ou da família. Se vc continua, vive sob a culpa da negligência. O termo "menas mãe" que eu tanto odeio. Cada mãe é de um jeito e não existe apenas uma fórmula para criar filhos ou um jeito certo, um manual ou uma teoria.

Eu concordo com minha amiga Stella. A gente tem que dar amor, carinho e respeito. O resto vai o que dá. Se tem leite, dá peito, se não tem, dá fórmula... O importante é a gente estar bem para não descontar nada na criança. Tem que ter sanidade acima de tudo. Não acho certo essa coisa de obrigar a mulher a fazer as coisas sob a lógica da culpa. Me dói o coração mulheres que passaram pelo maior sufoco e tiveram que fazer uma cesárea se sentirem mal e chorarem. Ou aquelas que tem complicações, que ficam com o seio sangrando, mas vão até o limite para tentar amamentar porque os manuais, panfletos e médicos dizem que o leite materno deve ser a ÚNICA fonte de alimento da criança.

Que sociedade é essa em que começamos considerando a mãe como um ser do qual se pode tirar tudo? Não concordo. Eu estou bem, meu filho está bem. Se eu tiver que trabalhar e ele largar o peito, é porque era pra ser. Não quero que o meu filho cresça achando que é normal só eu cuidar dele ou que eu faça tudo por ele. Eu quero sim que ele tenha segurança ontológica para ser independente e feliz, mas quero que ele saiba que existe um limite para as coisas que eu posso fazer por ele. E eu faço sim tudo o que eu posso.

É claro que eu gostaria de poder acompanhar todos os momentos do desenvolvimento dele. Mas eu gosto de trabalhar e não quero me sentir mal por isso. Além disso, para mim e muitas outras mulheres, trabalhar não é uma escolha. E para aquelas que podem escolher, é bom lembrar que a conquista dessa escolha foi um marco e um avanço na nossa sociedade do qual não podemos nem pensar em desejar um retrocesso.

E se eu tiver que trabalhar e perder os preciosos momentos do desenvolvimento do meu filho, que fique registrado que a culpa não é minha, e sim dessa nossa sociedade cara de pau que diz que valoriza a família, mas não estende a licença paternidade, nem a maternidade, não constrói creches públicas em número suficiente, não promove cidades mais seguras para as crianças, não dá nenhum benefício (real) para quem tem filho e etc.

Acha exagero? Talvez, mas coloco um questionamento: Porque as taxas de natalidade tem despencado no Brasil?

É uma maravilha ter filho. Toda vez que eu vejo meu bebê sorrir feliz eu ganho o meu dia. Quando ele dorme tranquilo, também. Mas não é mais possível pra mim e para muitas outras mulheres, assumir um padrão de maternidade que não condiz com a realidade do dia a dia das mulheres brasileiras. Estamos cansadas da tripla jornada. E como diz Elizabeth Badinter, não estamos mais discutindo isso publicamente, estamos sim tendo o número de filhos que podemos ter, numa revolução silenciosa. 

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Algumas reflexões sobre política

Não sou especialista no assunto, mas como posso votar, acho que tenho o direito de opinar. De fato, o voto é secreto e eu não precisaria anunciar minhas escolhas políticas na internet. Outro fato é que eu não votei nessa eleição. Também não me arrependi de não tê-lo feito.

Dizem que o Brasil está dividido e ressaltam que a diferença entre Dilma e Aécio foi de apenas pouco mais de 3 milhões de votos. Mas acredito que a diferença seria maior se pessoas como eu tivessem ido votar. Fico feliz e triste por Dilma ter levado essa. Eu até achei que ela não parecia muito animada em concorrer novamente. No início da campanha, me parecia estar cansada da política. Mas enfim, isso são apenas especulações.

Uma prima minha disse que queria saber porque eu voto no PT por ideologia. Dois erros nessa afirmação, eu não sou petista e não voto no PT por ideologia. Acho até que o PT não tem mais a mesma ideologia que teve no passado, mas é bom ressaltar que, por mais que os eleitores não tenham, todos os partidos políticos tem uma ideologia.

O humorado dicionário filosófico de Comte-Sponville diz que o termo ideologia significava a ciência das ideias e que seria então a ciência das ciências. Mas essa acepção caiu em desuso e o sentido que conhecemos hoje é o que foi dado à palavra por Marx. Esse seria:

 "a ideologia é um conjunto de ideias ou representações (valores, princípios, crenças...) que não se explicam por um processo de conhecimento - a ideologia não é uma ciência -, mas pelas condições históricas da sua produção, numa sociedade dada, especialmente pelo jogo conflitual dos interesses, das alianças e das relações de forças. É como um pensamento social, que não seria pensado por ninguém mas que pensaria em todos, ou melhor, dentro do qual todos, necessariamente, pensariam. A ideologia é inconsciente: ela é o lugar social e historicamente determinado de toda a consciência possível. É a linguagem da vida real. Ela é por natureza, heterônoma: sua história está submetida à da sociedade material, ela própria dominada "em última instância" pela infraestrutura econômica". 

O verbete se estende por mais 3 páginas, só para se ter uma ideia da tarefa complexa que se é definir "ideologia". Acho que a última parte é mais esclarecedora, as ideologias são próprias de uma sociedade. Eu diria ainda que cada segmento dela, devido a sua história, tem sua própria ideologia. Eu não me lembro se estudamos isso no segundo grau, mas em termos de política existem ideologias de esquerda e de direita muito parecidas. Por exemplo, se falarmos de extrema direita e extrema esquerda ou centro direita e centro esquerda. No Brasil temos uma certa dificuldade em entender essas diferenças também pela boa qualidade da nossa imprensa. Só para termos uma ideia, a notícia depois das eleições foi o que a capa dos principais jornais estrangeiros diziam sobre o nosso pleito. Os nossos realmente não tinham o que dizer. Pareciam estar esperando que os de fora lhes dissessem o que tinham que pensar.

Eu sempre me perguntei o que levava uma pessoa a ser de direita. Tive muita dificuldade em aceitar, até por preconceito. As ideologias de direita não pregam a igualdade entre os homens, por mais que digam serem todos os homens iguais perante a lei. Elas acreditam a liberdade de oportunidades, no estado mínimo, no livre comércio e no respeito a propriedade privada. Esse é um resumo, pois as ideologias tem muito mais do que isso. A direita não é necessariamente conservadora. E o grande atrativo dessa ideologia é a redução do estado, pois isso implica em redução da carga tributária. Mas na minha visão essas bandeiras acabam sendo conservadoras no sentido que se concentram em conservar privilégios de quem já está estabelecido quando se resolve "abrir" o comércio e reduzir o estado, deixando os mais fracos desamparados.

Muita gente da classe média é seduzido por essa proposta, pois a carga tributária tem um grande peso nessa classe, já que os mais pobres estão fora da faixa dos que pagam imposto de renda. O que muitos ignoram é que os mais pobres pagam proporcionalmente muito mais impostos, pois quase tudo o que consumimos é tributado no nosso país. Se levarmos em conta o gasto que uma família pobre tem com transporte, por exemplo, talvez seja muito mais alto do que uma de classe média gasta com imposto de renda. Mas quem se importa, não é mesmo? Farinha pouca o meu pirão primeiro. 

O que eu acho que as pessoas de direita ignoram é que a desigualdade social aumenta a violência. Além disso, contrario ao que muita gente acredita, é muito melhor uma sociedade onde a diferença entre ricos e pobres não é grande. Uma sociedade rica é aquela onde todos são ricos. Outra coisa que eu gostaria de comentar sobre o assunto é a famosa política "assistencialista". Todo mundo adora falar sobre o bolsa família, mas pouca gente gosta de se informar sobre o assunto. Alguns mitos merecem ser desfeitos. Nós não estamos dando esmola, o programa tem outras ações vinculadas a ele que funcionam como aperfeiçoamento e política de saída. Outra questão é o montante de dinheiro destinado a ele. Eu considero uma política direta e indireta. Tirar esse montante de pessoas da miséria ou da miséria absoluta tem consequências além da melhora na vida delas. Nós diminuímos gasto com saúde, reduz a violência, entre outros. De um certo modo o dinheiro não é só para eles.

O que muita gente não consegue entender é que isso é um exemplo de política direcional, na tipologia cunhada por Gøsta Sping-Andersen. Um governo falha em estender o estado do bem-estar social à todas as camadas da população. Direciona as políticas a uma só camada e acaba fazendo com que os setores da sociedade se desunam em vez de cobrar do governo que a política seja ampla. Exemplo, nem todos precisam do bolsa família, mas se a saúde fosse de qualidade, não seria necessário pagar um plano de saúde e todas as classes poderiam usufruir do sistema de saúde. O que muita gente acha é que o governo só ajuda a classe baixa. 

Só que no lugar de querer que todos tenham os mesmo direitos, muitos querem que os menos favorecidos sejam menos favorecidos ainda. A classe média, até certo ponto, pode arcar com um plano de saúde e fazer cortes para economizar no orçamento, mas como fazem aqueles que mal podem pagar uma cesta básica? É claro, a centro direita não é contra políticas sociais, mas pelo que eu já vivi até hoje, sei que o foco dela não é esse.

Qual o meu problema com a "livre iniciativa" e o "estado mínimo"? É histórica. Os países mais desenvolvidos do mundo não adotam mais essa política. E quando falo desenvolvidos eu excluo os EUA por 2 motivos: não conheço muito o que se passa lá e seu que a desigualdade lá é grande. Falo dos países europeus, pois conheço um pouco mais sobre eles, o Canadá e, infelizmente, não sei como a política funciona nos Tigres Asiáticos e no Japão, então ficarei só com os ocidentais acima citados. Os "avanços" da Inglaterra na era Thatcher são um bom exemplo do quão ruim o neo liberalismo pode ser. 

Reduzir o estado deixa uma lacuna. Quem pode pagar pelos serviços paga, quem não pode se lasca. Transferir para a iniciativa privada aquilo que o governo deveria fazer nunca funcionou no Brasil. Tem gente que pode argumentar que foi porque o modelo das agências reguladoras foi falho ou foi mal feito. Mas em alguma configuração seria diferente no Brasil? Voltando à livre iniciativa. O discurso é velho. Usam exemplos vitoriosos para dizer que todo mundo pode conseguir, mas esquecem que os vitoriosos são uma exceção e não a regra. Sem se lembrar também que os ricos tem mais oportunidades do que os outros. Ora, se pregam tanto a meritocracia, deveriam zerar as heranças familiares e a condição de vida de cada um para a competição ser justa.

Em resumo, é por isso que eu sou de esquerda. Poderia falar muito mais coisa sobre meu posicionamento, mas acho que uma hora é preciso resumir. E só para provocar, eu fico muito feliz com pessoas ricas e bem de vida serem de esquerda, a esquerda caviar, pois eles se beneficiariam muito mais com um governo de direita, mas mesmo assim, querem uma sociedade mais justa. Eu não. Estou mais para esquerda sardinha mesmo.

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

#vamosprarua


Eu tenho algumas teorias, sem muita base, que muitas vezes gostaria de compartilhar, mas acho que serei mal compreendida. Mas talvez por escrito a coisa não seja tão absurda.

Outro dia estava caminhando pela cidade e vi um grafite que dizia:

 "que mundo você vai deixar para os seus netos?"


 Isso me fez pensar que talvez esse raciocínio seja a razão de estarmos vivendo num mundo que desperdiça tanto e pouco liga para os recursos naturais. Não herdamos um bom mundo dos nossos avós e certamente não vamos deixar nada de bom para os nossos netos. Talvez porque ainda esperamos que os nossos filhos façam por nós o que deveríamos estar fazendo agora.

Eu já fico pensando no mundo que o meu filho vai herdar e eu não posso dizer que não tenho uma parcela de culpa. Me envolvi muito pouco no processo político, não importa em qual esfera da minha vida. Mas não é motivo para desistir. Ainda tenho muita vida pela frente e ainda posso deixar um legado do qual meu filho possa se orgulhar.

Mas voltando ao grafite. O que me incomodou? Bom, estamos diante de fatos que poderiam nos motivar a termos uma atitude mais inteligente diante dos desafios da modernidade. Por exemplo, a escassez de água do sistema da Cantareira em São Paulo. Porque as coisas chegaram a tal ponto? Primeiro porque temos um monte de político que imagina a vida do país apenas em termos da duração de seus mandatos. Depois, temos na nossa mente que o Brasil é um país continental, com recursos infinitos e para que eles comecem a acabar vai demorar muito tempo. Sempre podemos gastar um pouquinho mais. Além disso, temos uma economia baseada no agronegócio, que além de não nos alimentar acaba com as nossas terras e usa a nossa água potável. Mas infelizmente, todo mundo acredita ser crucial para o nosso crescimento. Tem gente que até pensa "A Europa consumiu seus recursos naturais e chegou onde chegou, para a gente chegar a algum lugar, temos que consumir os nossos também". 

Eu não concordo. Acho que é por isso que estamos sempre um passo atrás, porque nosso pensamento está parado no século XIX. Nós não podemos comer dinheiro nem beber dotz ou sei lá o que. Os nossos recursos naturais são sim a nossa maior riqueza, mas não para serem explorados, e sim para serem preservados. Eu vejo uma enormidade de pessoas com carros que bebem 8 litros de óleo a cada 5 meses, consomem 1 litro de gasolina a cada 8 quilômetros e andam sempre sozinhas dentro desses carros. Um utilitário enorme que nunca sai da cidade. Para quê a pessoa tem um carro desses? Qual a justificativa? Eu tento usar o mínimo possível o meu carro.

Aliás, esse lobby das indústrias automotivas é um absurdo. Ela não gera tantos empregos assim, manda a maior parte dos lucros para suas matrizes e nós ficamos com a poluição que esses carros geram, e sua má qualidade. A maior parte dos carros produzidos aqui não passaria nos testes de segurança. A indústria automotiva não é algo tão bom assim para o Brasil. Nós não ganhamos em tecnologia, somos apenas mão de obra barata.

Queria andar de bicicleta em Londrina, mas confesso que grávida ou com o bebê pequeno, tenho medo. As pessoas em geral, deixam de ser seres humanos para se tornarem bestas-feras-assassinas dentro de seus carros. E aqui não tem nem calçada para a gente escapar. Mas sabe de uma coisa, eu vou tentar. Vou tentar usar fralda de pano também, embora todo mundo me desencoraje.

Quanto a minha teoria maluca, ela se conecta um pouco a todos esses problemas no sentido de resolvê-los. Estou morando em Londrina e uma coisa que me animou é o preço das casas. Relativamente bem mais baratas que os apartamentos e não tão isoladas da cidade como as de Brasília. Mas todo mundo diz que é muito perigoso.

Eu acho que em parte, é porque as pessoas se fecham e deixam os espaços livres para os bandidos. Ninguém usa as pracinhas, anda pelas ruas. É todo mundo trancado, no carro, em casa, no trabalho. A sensação é ainda mais agoniante para mim, porque aqui é tudo muito apertado. Os carros se amontoam pelas ruas, as calçadas são minúsculas e você não tem nem onde esperar o sinal abrir, isso quando eles tem o de pedestre, pois muitas vezes a gente tem que adivinhar quando atravessar. Eu me pergunto, as pessoas gostam mesmo de viver assim? Eu não entendo, Londrina é uma cidade tão bonita, mas os moradores não conseguem perceber porque estão o tempo todo passando de carro pelas coisas, sem aproveitar nada. Ao mesmo tempo as crianças tem que brincar sempre em lugares fechados porque não dá pra ficar na rua. Se um menino perde a bola e sai correndo pela rua para pegar, provavelmente vai morrer atropelado. Pro isso eu acho que deveríamos ir pra rua

#vamosprarua


Ocuparmos os espaços, levarmos uma vida longe da loucura do trânsito é termos mais qualidade de vida. Temos que acreditar. Andar de transporte público quando formos percorrer longas distâncias, andar a pé quando o dia estiver bonito ou de bicicleta. Respirar um pouco de ar puro, conhecer os menores recantos da cidade. A gente tem um clima tão bom e não aproveita. Aqui não neva, faz sol, quase não tem chuva horizontal e nós sempre trancados, enjaulados.


É mais barato, mais democrático, mais saudável e acrescenta mais qualidade de vida na rotina das pessoas. Eu acredito que seja possível. Se os holandeses conseguiram, a gente também consegue. E não adianta esperar que o governo faça. A gente tem que começar.

sábado, 16 de agosto de 2014

Assunto encerrado

Realmente é muito triste e trágico o acidente aéreo que matou o candidato à presidência Eduardo Campos, mas a noticia para por aí. As investigações não foram encerradas e noticiar todo e qualquer movimento que se faça nesse sentido de pouco ajuda. Imagino que as famílias das vítimas devam estar sendo informadas do andamento da mesma. O resto, é enrolação de quem não entende o que mais está acontecendo no mundo e fica explorando a desgraça alheia.

Do que adianta mostrar a área afetada? Eu não ouvi em lugar nenhum alguém falando de indenização às vitimas. A empresa que alugava o avião tinha seguro? Ninguém quer saber. Queremos sabem onde foram parar os pertences pessoais dos passageiros. Muito mais importante. Mais importante especular o que aconteceu com o avião sem nenhuma evidência ou prova, adivinhar o que tinha na caixa preta que nem ela mesma sabia. Mas enfim, isso é notícia no Brasil.

É uma notícia simples e fácil. Colocam-se dois ou três jornalistas no local do acidente e eles exploram tudo com afinco. Entram nas casas atingidas com os moradores e mostram os estragos. Que beleza mesmo um apartamento todo queimado...

Meus sentimentos a todas as famílias das vítimas, não só do mais conhecido candidato. Que não era meu nem antes nem depois do acidente, mas devo confessar que esse assunto está para lá de esgotado. Nada do que a imprensa tem noticiado pode ser aproveitado. Inclusive, deve ser muito chato para as famílias, que além de lidar com a dor da perda, momento de introspecção, reflexão, devem aprender a lidar também com a superexposição.

Mas enfim, depois que o avião caiu o Ebola acabou, os confrontos mundo afora terminaram e o Sistema Cantarera está revigorado.


Eu realmente acho que de nada fez falta eu ter ficado tanto tempo sem televisão. A maior parte do tempo os jornais falam de futebol e no mais, tudo aquilo que você precisa ser informado, passa correndo no jornal local, batido no nacional e a gente ainda precisa aguentar o sensacionalismo com o que todos os eventos comoventes, como o tal acidente, são noticiados.

segunda-feira, 14 de julho de 2014

Aprendendo a lidar com os trolls...

Não existe fórmula mágica. Por melhor ou pior que os seus textos sejam, cedo ou tarde você se deparar com eles. Confesso que pelo volume de leitores que tenho todo dia no blog, acredito que até tenho poucos trolls comentando por aqui.

Antes de mais nada, devo dizer que muitas vezes fico lisonjeada em saber que tem gente que perde tempo para achincalhar alguém que não conhece na internet só porque não concorda com essa pessoa. Eu sempre priorizei criticar o comentário no lugar das pessoas. Afinal de contas, muitas vezes mudamos de opinião, o que significa que agimos de uma maneira x, mas não significa que somos assim. Mas os trols tem essa capacidade de argumentação superficial e de visão enviesada do todo que me surpreende muito. Muitos textos desse blog não recebem nem mais o meu olhar pela quantidade de comentários que mostram claramente que a pessoa que está comentando o texto não leu o que eu escrevi e está usando o meu espaço na internet para falar o que pensa, mesmo que não tenha relação com o assunto abordado no texto. É, as vezes parece uma coisa de louco.

No começo eu me irritava e perdia mais tempo do que o tempo que o troll levou me xingando para respondê-lo, pois eu tentavam "elevar" o nível da argumentação. Como diria um amigo meu, um trabalho contraproducente. Ninguém que perde 2 minutos lendo um texto e 15 procurando adjetivos para xingar você nos comentários vai perder tempo para ler calmamente sua resposta e ponderar se por acaso poderia estar errado ou que talvez tenha um aspecto na sua argumentação que valha a pena rever. Para falar a verdade, na maioria das vezes, quando alguém argumenta anonimamente existe 80% de chance de se tratar de um comentário que contenha pelo menos uma ofensa à sua pessoa, mesmo que no texto não haja espaço para esse tipo de interpretação.

Numa segunda fase, eu confeso, cheguei a me irritar tanto que descia ao nível do troll. Me irritava muito pensar que alguém poderia chegar ao ponto de me ofender gratuitamente na internet e não levar nem ao menos uma resposta desaforada. Infelizmente eu acabava me irritando mais e no fim, acabava chegando a conclusão de que a pessoa, ao ler o meu comentário desaforado ou nervoso, tinha atingido o seu objetivo. Objetivo esse que não era nem um pouco debater o tema em questão e sim me irritar. Como alguém que nem me conhece pode ter prazer em me irritar? Eu realmente não sei porque ou para quê, mas resolvi não dar o gostinho.

Atualmente eu cheguei a uma conclusão que pode não ser perfeita, mas tem me agradado por enquanto. Eu deixo o comentário lá desde que não use palavras muito ofensivas, mas não respondo. Eu ainda leio porque ainda existem os 20% dos comentários anônimos que vale a pena serem lidos. Consigo até achar graça de muitos, sempre na linha do "como essa pessoa conseguiu pensar isso desse texto?". Outras me deixam um pouco triste ao ver o analfabetismo funcional em ação. Mas não vamos encarar isso como um problema social e fazer deste texto algo que não é. Basta dar uma olhadinha em qualquer fórum pela internet para perceber que esse problema trolístico não é uma exclusividade brasileira.

terça-feira, 8 de julho de 2014

É, perdemos.

Podia acontecer, não?! Aliás, a gente já tinha perdido antes no Maraca. Mas enfim, eu não estava animada para essa copa. Mas eu nunca estive muito animada para nenhuma copa. Realmente eu não gosto muito de futebol, mas a minha questão é mais outra. Época de copa é uma overdose. Parece que nada acontece no mundo.

O Brasil realmente não para, mas a mídia cai em cima como se não houvesse amanhã. Isso me irrita um pouco. Devo assumir até que depois de ver 80% de todos os jornais repetindo a mesma coisa sobre a copa, eu sempre ficava com um pensamento "tomara que acabe logo". E de verdade, depois da copa, minha vida volta ao normal, como a da maioria das pessoas.

Quanto a vangloriar a seleção alemã… Eles eram melhores que a gente desde o começo. O problema é que a gente sempre espera um milagre. Montamos um time em cima da hora, escolhemos um treinador teimoso, apostamos 100% no craque. Olha a receita e o resultado. Mas é claro que isso não é culpa da nação brasileira. Nós, meros brasileiros não temos nem como votar no elenco.

Mas comparar o país Brasil com a Alemanha eu não acho correto. Somos um país ex-colonia sofrendo com a exploração econômica e com uma elite que não se identifica com o seu povo. Só na copa. Aí vemos todos pintados de verde amarelo torcendo nos estádios, vaiando a presidenta sem fazer a menor ideia da diferença entre protocolo e política. Vaiando o hino da equipe adversária e depois, na hora que perdemos, sentindo "vergonha".

Vergonha de quê? De perder um jogo?! Eu tenho vergonha dessas pessoas que deveriam sentir vergonha de não assinarem as carteiras de suas empregadas domésticas, de usarem a máquina de xérox do serviço para tirar cópia dos livros didáticos "na brodagem" para os coleguinhas de turma porque é "de graça" se não for ele quem está pagando. Vergonha a gente tem que ter de sempre culpar os professores quando eles fazem greve e nunca apoiar o movimento de verdade. Tem que se ter vergonha de reclamar do transporte público quando nunca se pegou um ônibus. Vergonha de só torcer pelo Brasil na Copa, de só se sentir parte do povo bem longe da pobreza, na área elitisada que a FIFA transformou nossos estádios. Vergonha dessas pessoas que mesmo que o Brasil ganhasse, falariam mal de tudo, não veriam nosso mérito mesmo quando temos, mas não aceitam crítica dos outros. Vergonha desses obtusos, dos torcicolados intelectuais, dos verdadeiros coxinhas (por mais que a expressão já esteja bastante esvaziada).

Não acho vergonha perder um jogo para uma equipe que jogou melhor e talvez seja a campeã. O placar poderia ser melhor? Poderia. Mas o futebol é assim, uma caixinha de surpresa. Nós inventamos o ditado e não sabemos o que ele significa?!

A Copa é um evento onde jogam times que são compostos por pessoas que tem inteligência esportiva. Não podemos esperar que seja uma arena para um debate político produtivo, que seja a tradução do Brasil como nação. Claro que o futebol ajuda na coesão social, no sentimento de pertencimento do brasileiro. Mas todos sabemos que ganhando ou perdendo o futebol não apaga nossos problemas. Quem são esses 200 milhões em choque?

Eu não estou em choque. Estou chocada com o número de casos de dengue em Londrina. Com a novo vírus que é agora carregado também pelo mesmo mosquito. Com o número de vítimas das enchentes todos os anos pelo país afora.

Então, sinceramente, me desculpem os mais abalados, mas acho que a gente chora e entra em choque por coisas que realmente afetam a nossa vida e a da nossa comunidade.

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Brasília é uma cidade turística, mas não é preparada para receber turistas

Mais uma vez eu me espanto com a maneira com que vemos as críticas.

Felizmente eu tive a chance de turistar em algumas cidades do Brasil e outras fora daqui. Entendi muito do que o crítico do New York Times falou em sua reportagem e achei um pouco exagerada a reação por parte de alguns brasilienses.

Não me entendam mal, todos tem pontos em seus argumentos. Começo dizendo que a percepção de alguém de fora e de alguém que mora na cidade são diferentes. O modo como a cidade lida com turistas e com nativos também é. Brasília, como muitas outras cidades no Brasil não é preparada para receber turistas, por mais que tenha potencial turístico.

Não temos mapas da cidade em locais de fácil acesso. Não existem itinerários dos ônibus nas paradas ou qualquer outra informação em outra língua que não seja nas recentes placas de sinalização. Não existe um cartão da cidade que te dê desconto em peças e shows e que sirva também para o transporte público. Eu não sei como funciona o cartão do metro e se existe alguma integração entre ônibus e metro em Brasília, mas pela simpatia dos funcionários que vendem as passagens, eu, mesmo quando morava lá, nunca me senti impelida a perguntar. Mas será que eles falam inglês? Eu duvido.

Onde fica o Turist Office de Brasília? No aeroporto? Nas outras cidade que visitei, a maioria deles ficava no centro, mas Brasília não tem centro. O lugar mais movimentado da cidade é o trecho entre o Conjunto Nacional e o Pátio Brasil, passando pela Rodoviária e o Setor Comercial Sul. Nada muito turístico.

Aliás, é bom ressaltar que a maioria das pessoas prefere conhecer os pontos turísticos à pé e se deslocando entre grandes distâncias pelo transporte público. Algo muito difícil de fazer em Brasília por isso a sensação de isolamento. Se optar por andar a pé, não se chega a lugar algum em menos de 15 minutos de caminhada. O brasiliense (e talvez o brasileiro em geral) gosta do binômio carro-shopping, mas isso é algo que se faz e que existe em quase toda cidade do mundo. E vamos e convenhamos, shopping é tudo igual, as lojas são quase todas as mesmas. Bom mesmo é andar à pé, e de repente descobrir algo diferente do que estava planejado. Uma pracinha charmosa, um café, um monumento que não estava no guia...

Mas enfim, voltando ao texto. Veja bem, o cara é turista, ele não está frequentando a escola para fazer amigos. Como vai conhecer as pessoas em Brasília? Eu morei 30 anos lá, desde que nasci até pouco tempo, e acho, sinceramente, que se você não tem ninguém para te introduzir a alguma turma, fica muito difícil fazer amizades ou descobrir onde ir e o que fazer. Se virar sozinho então, sem falar português parece um desafio e tanto.

Bem, quanto ao entorno de Brasília, existem lugares bonitos, cachoeiras, natureza e etc. Mas as cidades satélites em si são mais uma massaroca de concreto desordenado e feio. Não discuto que são bons lugares para se morar, mas se eu fosse turista em Brasília não gastaria meu tempo conhecendo Águas Claras ou o Guará. É o tipo de lugar que a gente só vai se tem o que fazer ou quem visitar.

É claro que o colunista do NYT usou um monte de clichês para falar de Brasília e suas críticas parecem ter sido embasadas por uma observação bem superficial. Um lugar frio o pouco acolhedor. Bom, você pode usar quase todos os argumentos referêntes a esse aspecto da cidade a críticas feitas ao bairro da Défense em Paris. Acho que o concreto armado inspira esse tipo de comentário.

Mas Brasília tem sim seus paraísos perdidos em meio ao concreto. O parque da cidade, muitos jardins nas entrequadras, bares charmosos e cafés acolhedores… Pena que não dá para ver quase nada disso da janela do carro.

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Como reivindicar algo do jeito que a imprensa quer?

Esse post surgiu depois de refletir um pouco sobre o que a mídia quer da população. Sabe, desde as manifestações de junho do ano passado que escutamos coisas como "a população tem o direito de manifestar, mas sem violência", "as manifestações devem ser pacíficas", "nada de vandalismo" (e olha que muitas vezes os ônibus que são queimados já deveriam estar fora de circulação a muito tempo)... E dá-lhe críticas aos Black Blocs...

Mas é engraçado, pois na maioria dos países do antigo 3º Mundo as manifestações sempre acabam em violência por conta da intervenção da polícia. Mas enfim, eu pensei bem e queria compartilhar alguns pontos:

- Os manifestantes tem sido enquadrados pelo crime de formação de quadrilha.
Na ditadura um aglomerado de pessoas conversando no meio da rua era caracterizado de que mesmo? Alguma semelhança? Todos aqueles que foram presos fizeram alguma coisa?

A rede Globo não precisa lembrar, afinal, o Estado detém o uso legítimo da violência. Mas sabe, eu não me lembro se Max Weber se referia ao regime democrático. E mesmo se fosse, não acham que essa visão está um pouco ultrapassada. Falamos em democracia representativa e participativa a mídia puxa essa carta amarelada e mofada de "uso legítimo da violência".

Tudo bem, vamos voltar com o quesito reinvidicações. Como a mídia espera que façamos as tais reivindicações? Os abaixo assinados podem (e muitas vezes) são ignorados. O que eu tenho impressão de que querem que façamos, no lugar das manifestações, algo tal um carnaval fora de época. Ou uma espécie de CRUJ (Comitê Revolucionário Ultra-Jovem) que lutava por máquinas de refrigerantes nos corredores da escola e recreios de 1 hora. A imprensa não gosta da população séria externando sua indignação com palavras de ordem. Não, temos que estar todos de mãos dadas, caras felizes e flores nos cabelos. Nada de coisas sérias, por favor. Dá trabalho para os repórteres. Eles vão ter que estudar para entender, quem dirá explicar.

Mas porque manifestar então. Achei que o propósito de ir às ruas era justamente bradar para que a população seja ouvida, incomodar. Pois eu tenho a impressão de que os políticos não fazem a menor ideia e não tem o menor interesse em agradar o seu eleitorado. Vide a "mini-reforma eleitoral".

Quais são os mecanismos democráticos de reivindicação? O voto? Muitos caçoaram o #nãomerepresenta, mas o que fazer quando isso é verdade? Eu tenho um voto para gastar com um candidato que pode ou não ser eleito. Dentre as opções de candidatos que são apresentados, o que fazer se nenhum me agradar? Eu sou mesmo obrigada a escolher o menos pior? Se a minha única ação política é votar, porque eu não posso votar diretamente nos assuntos que me interessam? Porque tenho que escolher um representante? E porque esse representante, mesmo sendo eleito por mim, vota de acordo com as afiliações partidárias, troca votos por postos, ministérios... E eu, tenho que ver isso e ficar contente? Falar "pelo menos eu votei consciente", deitar minha bunda no sofá em frente a televisão e ficar esperando um milagre acontecer?

Ou ainda, até que ponto estratégias como tentar colocar membros de um mesmo partido no poder para que o governo tenha uma maioria x ou y não é ser condizente com um sistema que confunde ideologia com interesse? Agora estamos mais uma vez próximos das eleições e o que eu mais vejo são comentários vesgos sobre política. Confunde-se o governo com uma pessoa, o partido com um político, uma ideologia com uma barganha.

Outra coisa que me preocupa é a pouca representatividade dos sindicatos e a aparelhagem da CUT. Regulamentação de greve e a simples possibilidade de se considerar uma greve ilegal para mim soa como um modo de impedir as reivindicações da população, das classes de trabalhadores. Os sindicatos sempre foram a forma dos trabalhadores se organizarem, pois os partidos políticos sempre exigiram tempo e dinheiro que essas classes não dispunham.

Entretanto eu não acredito que não exista a diferença entre esquerda e direita. Acho apenas que muita gente se esqueceu o significado disso. Eu sou de esquerda, mas o PT não é o meu partido.

Certa vez eu disse que o brasileiro vota no político e o que quis dizer com isso é que muitas vezes ignora o funcionamento do executivo e supõe que seu candidato possa de alguma forma ser um ser todo poderoso que deseja e faz. Quase um justiceiro que não está sujeito às regras do nosso regime, ou que de fato o regime o permite fazer o que quer e que não beneficie aquele que age como todos. Enfim, votamos no político, mas ele não está sozinho. Os partidos que aí estão são cada vez mais do mesmo. Eu e a maioria do país votar nulo não irá anular o pleito nem obrigará uma mudança nas candidaturas. O sistema que aí está não permite aos pequenos, os ainda idealistas, que realmente disputem.

- Me diga então, oh, grande mídia toda poderosa, o que devo fazer?
- Votar ou não votar, eis a questão? Só?

terça-feira, 20 de maio de 2014

O paradoxo da maternidade

Muitos ainda acreditam que o papel da mulher é ser mãe. A alegação se baseia no papel supostamente "natural" e "biológico" do sexo feminino. Para continuar com essa afirmação em tempos onde os instintos são tão pouco valorizados e tentamos ao máximo nos separar da natureza, fala-se do gratificante papel da mãe. Temos até um dia para elas (!) Mas contrariamente ao que se possa imaginar, a maternidade não é tão valorizada assim no nosso país.

Apesar dos clichês existe um paradoxo na maternidade. Ele reside na sua real importância e na competência da mulher para exercê-la. Desde a gravidez até o parto e para o resto da vida. Ao mesmo tempo que é valorizada como mãe, não é dado a mulher autonomia para gerir seu corpo, seu parto, seu filho. E contraditoriamente é a pessoa mais autorizada a exercer essa função. Em algumas sociedades, como a nossa, de base extremamente sexista, nem ao menos empurrar o carrinho é uma função que pode ser exercida por homens.

Bourdieu, em seu livro "A dominação masculina" expõe a teoria de que todos os papeis da mulher na sociedade contemporânea tem relação com a maternidade e o cuidado que deriva dela. Secretária, professora, enfermeira... Como se o papel da mulher fosse uma grande continuação da maternidade over and over.

Felizmente o debate e a luta contra esses papéis vem se acirrando. E a famosa frase que eu ouvi durante todo o meu mestrado e que ressoa aos meus ouvidos "quando você for mãe, você vai entender", pode conter um futuro menos apocalíptico do que parece. Mas uma coisa eu devo confessar, por mais que tenha aprendido, com a gravidez mais do que nunca, a fazer ouvidos de mercador, o que mais sinto é indignação feminista na veia. Pois a verdade é que ao ser mãe não ganhamos tanto respeito ou autoridade quanto poderíamos esperar.

Duvida? Porque então as mulheres são tão mal tratadas na sala de parto? Porque são vítimas do teto de vidro no mercado de trabalho por conta a simples possibilidade de serem mães? No fundo no fundo não tem autoridade para decidirem nem como querem parir. Depois ainda temos a enorme responsabilidade de cuidar do bem estar físico e emocional dos bebês, levando todas as frescuras da sociedade em consideração pois podemos ser acusadas de negligência o tempo todo. Como disse a Badinter, o sinônimo de maternidade é culpa.

Culpa que nos fazem sentir desde o instante em que engravidamos. "Mas você não se preparou antes de engravidar?", "está tomando isso, comendo aquilo, fazendo assim, pesando assado"... Tem que ler um monte, pois nem o que vai comer ela tem autonomia para decidir. E o que eu acho mais engraçado é que as cervejas importadas vem um símbolo de que mulheres grávidas são proibidas de ingerí-las (o que sabemos que não é verdade absoluta), mas outras coisas que grávidas não deveriam comer, não são reconhecidamente proibidas para gestantes. Se você não está informada, pode acabar comendo algo que não deve, fazendo algo que não deve. Nenhuma informação é de fácil acesso, nada é confiável. E ainda assim, a culpa é 100% sua, só sua.

Paralelamente a isso, temos que lidar com o fato de não sermos autoridade suficiente para escolher pelos nossos filhos e lidarmos com as consequências. Parece que a sociedade toda é um grande espião. Devemos entender que o cuidado com a criança não deveria ser nem chamado de maternidade. Algo que poderia sim ser dividido entre os sexos deveria ser entendido como cuidado parental. O próprio termo maternidade influencia homens a continuarem negligentes com a função. Praticamente tudo o que a mãe faz o pai pode fazer.

Muitos falam que só a mulher pode amamentar. Bom, agora eu sei que o percentual de mulheres que não tem leite ou do qual o leite não é suficiente é grande. Insistir nesse argumento faz com que essas mulheres se sintam menos mulheres (visto que isso e o parto parecem ser as exclusividades femininas em termos de parentalidade), mas também faz com que homens, que poderiam participar desse momento, onde muitos afirmam ser onde se a cria o vínculo com a criança, fiquem de fora tornando a relação deles com os filhos distante. Se qualquer um pode dar leite para a criança no copinho, porque o pai não pode fazer?

A maternidade é função da mulher, muitos dizem e afirmam. Mas as mulheres estão cercadas de autoridades masculinas mais capazes de julgar seu papel do que ela. Médicos, juízes… Sinto muita vontade de não ouvir nada. Sinto muitas vezes raiva de quem fala, com sarcasmo, "você vai ver, vai entender". Porque jogar uma praga nos outros? Se ter um filho é uma experiência tão única porque supões que todxs a encararão da mesma maneira?

Enfim, seria tão melhor se as pessoas esperassem a gente perguntar do que saírem por aí se metendo na maternidade dos outros, ou melhor, na parentalidade dos outros.

Em contrapartida, governo e sociedade não fazem nada para aliviar o fardo. Ter um filho não tem nenhum incentivo do governo. O bolsa família é exclusivo para uma faixa da população. Deveria ser estendido à todas. Não ganhamos o enxoval do bebê, não temos creches, berçários, nada em quantidade suficiente. Em suma, não ganhamos nenhum incentivo por colocarmos mais um brasileiro no mundo, no máximo um dia por ano e uma comemoração ridícula, um "feriado" com fins comerciais para quem já gasta tanto por negligência do governo.

quinta-feira, 8 de maio de 2014

A sinceridade

Esse é um tema bastante espinhoso. Falar a verdade por aqui pode ser um comportamento muito criticado. Desde coisas bobas como "não gostei" ou "não quero" até colocar suas opiniões em relatórios supostamente "objetivos".

Um exemplo clássico dessa dificuldade nacional é recusar um convite. Sempre temos que estar tencionados a comparecer, por isso devemos inventar algo, nem que seja a famosa consulta ao dentista ou o exame de sangue para recusar um barzinho com os amigos. Parece que dizer "não estou muito a fim" ou "não estou muito animado" é equivalente a dizer "você é um chato e eu não quero sair com você".

Eu percebi isso com mais clareza quando estava na Suécia. Minhas amigas sempre faziam "diners parties"e muitas vezes eu só queria ficar em casa na companhia do meu marido que trabalhava umas 10 horas por dia. Eu, no meu hábito brasileiro, com vergonha de dizer "não", soltava um "maybe". Pra que!? Depois eu ficava sabendo que era presença contada na festa. Que para eles, os alemães, talvez era quase "sim", quando aqui, é mesmo "não".

Uma amiga minha indiana me ensinou bastante sobre sinceridade, embora eu nunca tenha dito isso a ela. Uma pessoa franca, não sei se a cultura indiana é assim, ou se era ela mesma. Mas não tinha medo de dizer que não comia comida ocidental, que não gostava disso, daquilo e que achava isso ou aquilo. E era engraçado, pois ela não tinha papas na língua. Falava sem floreios. Não é à toa que era o guia da turma. Sempre que alguém precisava de um conselho, recorria à ela. E é engraçado, pois eu quase sempre concordava com ela. Mas acredito que se ela vivesse por aqui, não teria tal posição. Acho que seria considerada grossa ou tosca.

Outra coisa interessante é que você aprende a ouvir os outros de uma maneira mais tranquila e principalmente, respeitar sim as diferenças. E talvez por isso, consiga até conviver melhor com seus amigos. Uma certa vez, um amigo nosso recusou um convite dizendo "Vou tomar café e ler artigos. Sempre faço isso às quintas-feiras". No começo achei estranho alguém ter uma agenda assim, mas depois de uns tempos morando por lá, percebi que muitas vezes para dar conta de se fazer tudo o que se tem que fazer é preciso colocar na agenda, senão não sobra tempo para se fazer o que quer. No fim, ele acabou aparecendo no bar para nos encontrar, mas desconfio que só depois de ler uns artigos antes.

Quando estava lá, recebi muito poucas visitas. Uma delas me desapontou muito nessa "brasilianidade". Eu não tinha muito dinheiro para viajar e precisava organizar as coisas com antecedência. Essa pessoa ficou hospedada na casa de amigos numa cidade próxima. No mesmo período, meus sogros estavam na nossa casa e iriam embarcar no tour pela Escandinávia em poucos dias. Resumo da ópera, eu deixei meus sogros no hotel e fui encontrar essa amiga. Mas algo me chamou a atenção: ela não parecia fazer muita questão de me ver. Achei deselegante essa atitude, sendo que ela sabia que eu estava abrindo mão de passar mais tempo com eles para encontrá-la. Mas se ia me tratar com descaso, porque não me poupou a viajem?

Eu sei que muitas vezes as pessoas se magoam com a gente e a gente não sabe ao certo o motivo. Acredito que quando a gente não acha que fez algo errado, não consegue prever os melindres alheios. Mas será que esse descaso não foi um resultado desse hábito de ter que estar, em tese, sempre disposto? Ou pior, talvez ela tenha pensado que eu fosse me magoar ao ouvir que ela de fato não queria me ver e fosse preferir ser mal tratada por ela. Faz sentido, né...

Outra coisa que considero parte da hipocrisia nacional é o respeito às diferenças. Todo mundo fala, mas quem é que realmente respeita? Em toda a discussão parece que quem puxa a carta da diferença é aquele que não tem argumentos ou que não consegue aceitar outro ponto de vista. No fim, o que você percebe mesmo que sua diferença será respeitada sim, quando for igual a de todo mundo, ou seja, não seja diferente.

Outra coisa que me irrita muito é a máxima de que existem diferentes maneiras de se dizer a verdade, indicando que haveria uma certa e uma errada. Quando eu digo "verdade" é no sentido de dizer o que o outro realmente acha ou pensa. Ninguém é de fato dono da verdade. Mas as pessoas confundem aquela mentirinha de elogiar uma roupa que você de fato não gostou porque percebeu que a pessoa está se sentindo bem nela e perguntou sua opinião com coisas mais sérias, como trabalhos de escola, feedbacks profissionais e etc. Tudo sobre a desculpa do "existem maneiras de se falar isso ou aquilo". A discussão sai do plano do conteúdo do que foi falado e vai para o da forma como foi falado e aquilo que se disse não tem mais importância.

Eu confesso que sofri muito durante a minha adolescência por ser sincera. Claro que quando era adolescente, acrescia uma dose de sarcasmo à minha sinceridade, e isso sim, eu descobri que é, em muitas vezes, desnecessário. Mas hoje não me arrependo de ser como sou. Ao contrário de muitos que se fixam na minha imagem adolescente, eu não saio por aí falando as minhas verdades ao vento. Reservo sim minhas opiniões mais sinceras ao crème de la crème dos meus amigos, mas também não sou hipócrita. Aquilo que sei que não será bem recebido, não minto, omito.

Não me envergonho de ser sincera. Não digo que sei tudo, mas tem muita gente que gosta de interpretar assim. Fica sentido pelo o que eu falei e racionaliza dizendo a si mesmo "quem ela pensa que é? acha que é a dona da verdade?". Para esses, fica o meu lamento. Quem souber ouvir uma opinião sincera, e desencanar se não concordar, talvez se beneficie da companhia, mas quem não souber, se poupe e não me pergunte o que eu acho. Também não tenho medo de ouvir respostas de qualquer jeito e esse eu acho que é o segredo. Como diz o batido ditado "Quem fala o que quer ouve o que não quer".

No mais, por mais "autista social" (como um amigo meu me chamou outro dia) eu possa ser, sinto que estou bem comigo mesma nesse aspecto e talvez aqueles que não gostam da divergência e chamem isso de falta de tato social, não tenha muito do que se orgulhar.

terça-feira, 6 de maio de 2014

Porque eu AMEI Breaking Bad

Antes de mais nada, gostaria de avisar aqueles que ainda não assistiram a totalidade do programa que NÃO leiam esse post. Muitos SPOILERS.

O principal motivo pelo qual gostei do seriado, foi a narrativa: simples e direta. Além de cumprir a proposta que faz . Não é necessário ler livros para se entender o que passa na série. Os dois principais personagens, Walter White e Jessie Pinkman foram muito bem pensados. Os atores ajudaram. Mas o que eu mais gostei foi o sentido dado ao título do seriado que norteia toda a narrativa.

O meu marido tem um certo problema com expressões idiomáticas. Muitas vezes traduz literalmente do inglês expressões que ele presume que serão idênticas no português. Uma que eu sempre achei engraçada foi o tal do "quebrar a personalidade". Não sei como deve ser a original em inglês, mas assumo que tenha "breaking" em algum lugar.

Temos então os dois protagonistas: Walter White e Jessie Pinkman. A princípio tudo leva a crer que Breaking Bad é uma referência a falência do personagem principal por conta da incapacidade de pagar pelo tratamento de câncer que precisa. 

Ao olharmos para Walter White da primeira temporada, imaginamos um homem comum, honesto, que tem dois empregos para dar conta de prover sua família como se deve. Ele aparece nessa temporada como um homem discreto. Mas uma coisa parece não encaixar: sua escolaridade. Incompatível com os demais membros de sua família e de seu núcleo familiar. A então modéstia do personagem levanta algumas suspeitas. Quando aparecem os ex-sócios de Walter, imaginamos que ele foi injustiçado na sociedade, como tantos outros casos que vimos por aí. Talvez essa tenha sido a razão pela qual se encontra na posição em que está no início da trama: professor de um College durante meio período e lavador de carros no outro.

Tudo bem que essa parte de lavador de carro eu não consegui entender muito bem. Um trabalho que ainda tem relação com sua formação, como professor de Química de uma escola, eu até entendo, mas lavador de carros, eu confesso que não consigo entender. Mas é preciso entender um pouco de como funciona o mercado de trabalhos braçais lá fora. Talvez o segundo emprego pagasse melhor do que o primeiro e ele só continuasse dando aula para se manter perto da sua área de formação.

Já Jessie Pinkman começa a série como um dependente químico controlado pelo vício que parece ter problemas em perceber a idade que realmente tem. Ele age como um adolescente, se veste como tal e fala como tal. Impulsivo e inconsequente, o jovem é menos carismático no princípio que o íntegro professor de Química. Esse porém nos deixa com pena, pois ao descobrir que tem câncer, ele tenta continuar suas atividades normalmente para não alarmar a família.

Com o passar das temporadas o papel se inverte. Vamos percebendo que a postura íntegra de Walter White é sim um papel que ele representa e só o faz por ser orgulhoso. Incapaz de ser rico, talvez por culpa do próprio orgulho, ele faz de tudo para conservar a reputação de homem correto. Vemos então o orgulho que ele tem da droga que elabora e como fica irritado quando alguém tenta imitar o seu produto. As provas desse orgulho aparecem nas últimas temporadas, quando alerta o cunhado policial sobre a possibilidade de Gael não ser o famoso Heisenberg e quando mantém guardado o livro que o primeiro lhe dá de presente pois contém comentários elogiosos a respeito dele.

Já Jessie, mesmo sem ter no que se agarrar, sem ter uma desculpa, não concorda em matar, extorquir ou mesmo se meter com gente perigosa. Já Walter tenta se convencer de que aquilo é um negócio, como se assim pudesse se distanciar do mal que a atividade causa ou que pelo fato de estar fazendo o que faz para proteger sua família, seu pecado seria menor. Chega a parecer as vezes que ele se sente injustiçado pelo mundo e está no seu direito de reagir.

Outra coisa que causa estranheza a primeira vista é como a relação dos dois vai se intensificando. A princípio, Walter despreza Jessie e só propõe uma parceria porque precisa de alguém para introduzí-lo no meio. É engraçado pensar que Jessie fora aluno de Walter e detestava o professor que aparentemente se decepcionou com o aluno. Quando os dois se reencontram, tempos depois de Jessie ter largado a escola, ele está justamente trabalhando no cozimento da droga, uma atividade química. Ele também é o único que consegue repetir o processo de Walter e produzir o "blue sky". Mas nem por isso ganha o respeito de Walter.

A relação dele com Jessie é como se o último fosse o único resquício de humanidade e bondade que pudesse emanar de Walter. Ele se apega ao garoto e o protege na tentativa de se fazer parecer mais humano frente aos outros. Mas o pupilo vai conhecendo cada vez mais a natureza sórdida de Walter que o faz desprezar o professor. Infelizmente ele se vê preso a ele e ao negócio e age como um autômato em vários momentos da série por ser incapaz de agir como Walter, sem escrúpulos.

Ainda nesse momento da série muitas vezes duvidamos se Walter é realmente esse monstro, mas para quem reluta em acreditar, nos últimos episódios da série, ele dá um telefonema para a mulher confessando o assassinato de seu cunhado (que não diretamente praticado por ele, mas que havia de fato sido arquitetado por ele) e ameaçando a esposa. Pela primeira vez ele se revela completamente na trama, pois não busca se justificar com motivos nobres suas atitudes.

Por fim, e eu vou parar por aqui, mesmo tendo mais coisas para comentar, há um confronto final entre Jessie e Walter onde o primeiro tem a chance de se vingar do segundo. E ao invés de se desumanizar como Walter, Jessie o deixa viver, o que é uma pena para Walter, pois ele não tem mais a máscara de bom moço nem a justificativa de estar zelando para o bem de sua família. Ou seja, todo o seu disfarce de desfaz por completo, um processo que vem acontecendo desde a primeira temporada, e aí que ele "breaking bad".

O seriado ainda poderia se estender mais, mas esse é o bom dele, afinal, quando começa, já sabemos que Walter vai morrer. Só nos resta saber se em decorrência do câncer ou do envolvimento com o tráfico de drogas. Ele não tem porque enrolar. Eu entendo que os processos são inversos: a desconstrução da falsa normalidade e honestidade de Walter em contraponto com o fortalecimento do caráter de Jessie. O primeiro vai de herói a anti-herói e o segundo sofre o processo inverso.

#breakingbad

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

O novo cortiço brasileiro

Também chamado de "novo conceito de habitação".

Quando Aluísio de Azevedo escreveu O Cortiço, em 1890 tinha uma preocupação em mente: relatar os problemas sociais daquela comunidade. É claro que o cunho realista-determinista da obra faz crer em alguns momentos que os problemas ali expostos são devido a natureza e etc. Confesso que não me lembro bem do romance, coisas da leitura impositiva. Lembro melhor do filme. E no filme o que mais me marcou foi a caracterização do próprio cortiço.

Eu, quando criança, morava num bairro que era por muitos considerado periferia. Muitas vezes não falava onde morava para meus colegas de escola por vergonha. É fato que sofria bem pouco bullying na escola, mas a vergonha era automática. A semelhança do cortiço com o bairro onde morava era a vida pública das pessoas: roupas dependuradas na janela, crianças chorando e principalmente; casais brigando no meio da rua, e principalmente o espaço pequeno que fazia com que parte da sua vida acontecesse fora da sua casa. As pessoas do cortiço tinham me lembrava muito o apê onde morava: 2 quartos, uma sala com 2 ambientes bem pequenos e uma cozinha que mais parecia um corredor onde não cabiam duas pessoas ao mesmo tempo. Meu apê era bem melhor do os quartos do cortiço, mas era muito apertado.

Recentemente fui olhar apartamentos para alugar em outra cidade, pois irei me mudar e não foi que toda essa sensação de viver num cortiço voltou a minha mente?! Os prédios são super "chiques"; tem garagem, espaço gourmet, piscina, sala de ginástica... E 3 quartos, uma sala, uma cozinha e 2 banheiros espremidos em 60 metros quadrados.

A justificativa para esses apartamentos compactos é que tudo aquilo que você não pode fazer na sua própria casa, você faz na área comum do prédio. Mas a minha pergunta é como? e pra quê? Se todos os moradores dos 38 andares e dos 76 apartamentos resolverem frequentar o espaço gourmet, a piscina, a sala de ginástica e etc nos horários livres (que para a maioria das pessoas é o mesmo), não vai caber. E bom, eu sou uma pessoa reservada. Ninguém parou para pensar que nem sempre você quer fazer a social com o seu vizinho? Claro, nem todo mundo usa esses espaços, mas mesmo assim, porque não tirar essas bobagens do prédio e aumentar uns 10metros quadrados dentro do apartamento? Porque a gente tem que viver numa gaiola? Porque não dá para colocar uma esteira dentro de casa sem ter que se livrar da cama?

Um dos prédios que eu visitei tinha uma lavanderia. A corretora me mostrou toda contente. Parece que isso está virando moda por aqui. Bom, eu já morei fora e lá é muito comum ter uma lavanderia comum por prédio. Onde eu morava tinha que marcar hora. Mas existem lugares que se a máquina está livre, pode ser usada. Isso parece muito bom, mas imagina se tem uma pessoa folgada que resolve ocupar todas? Ou você ter que ficar supervisionando a sua roupa para ninguém tirar ela da máquina antes de acabar de bater?

Onde eu morava, só o morador que tinha reservado a lavanderia para aquele período podia entrar lá, pelo menos. Mas para dar conta de toda roupa eu tinha que passar um dia inteiro lavando e colocando para secar. Não podia dar mole e perder o tempo do ciclo de lavagem ou secagem porque a máquina levava de 4 a 5 horas. A de secar, se perdemos o tempo, ela esturrica a roupa, claro, elas tem timer, mas como você acha que eu aprendi o tempo certo para cada peça? Em suma, é um saco porque você não pode colocar a roupa para lavar e ir fazer outra coisa. Pendurar quando puder.

Isso NÃO é vantagem. É bem melhor ter a máquina na sua casa. Sabe porque fazer isso? Se não tem máquina de lavar, não precisa de área de serviço e o apartamento fica cada vez menor. Se tem espaço gourmet, para que cozinha?

E no final, vamos morar todos em cortiços "conceituais"- Mouquifau Residence.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Quem tem medo de rolezinho?

"Daqui do morro dá pra ver tão legal
O que acontece aí no seu litoral
Nós gostamos de tudo, nós queremos é mais
Do alto da cidade até a beira do cais
Mais do que um bom bronzeado
Nós queremos estar do seu lado"

Nós vamos invadir sua praia - Ultraje a Rigor

Eu acho esse música a cara do rolezinho. Adoro também ouvir as opiniões dos "especialistas" (gostaria de saber onde eles acham especialistas tão desinformados) sobre os rolezinhos. Mas o principal, eu fico muito triste em ver que o brasileiro é tão classista e preconceituoso. Tem medo do seu próprio povo. 

Mas antes eu vou dizer o que eu acho dos rolezinhos friamente - se tem gente que ainda quer frequentar o shopping, a administração dele devia mais era deixar. Eu acho shopping um saco. É ruim chegar, caro para estacionar, fechado, cheio e com o único objetivo de te fazer gastar dinheiro. Você raramente vai fazer alguma coisa além de perder o seu dinheiro lá dentro. Tudo é feito para você achar que a realização pessoal está em comprar um bando de porcaria que no fundo nem precisa. É diferente, por exemplo, de um museu, onde você paga para entrar, mas vê um monte de coisas interessantes.

Eu fui vendedora de shopping por um ano e não precisei de mais para entender como funcionava. É um ambiente estranho e competitivo. Mas qualquer um pode ser vendedor, inclusive aquele povo que os gerentes estão tentando barrar, basta saber vender. O que acaba acontecendo é o que é proibido por lei. Os vendedores são escolhidos pela aparência e pela experiência. Nas lojas mais chiques, os mais bonitos das classes mais altas, nas lojas mais ou menos, os mais bonitos das classes mais baixas.

Mas o preconceito do shopping não começou com o rolezinho. Os vendedores são tratados como lixo, os funcionários também. Não existe cantina na maioria deles para que você leve seu almoço e o moço da marmita, na minha época, foi proibido de entrar no shopping. O que você vai fazer com os seus 15 minutos de almoço? Muitas vezes você nem quer perder esse tempo todo porque a loja tá bombando. Mas faça o teste, o que você consegue comer rápido e que preste num shopping? 

Além disso, na minha época sofríamos bullying por parte da direção do shopping. Eles baixavam normas absurdas, como por exemplo, a de que era proibido escovar os dentes no banheiro porque isso incomodava os clientes. Teve até rumores de que iam proibir nossa entrada nos banheiros. Eu não me lembro se havia um banheiro para funcionários, mas acho que pela nossa revolta na época, não. Tinham uns túneis na época, para evitar que o pessoal da limpeza andasse com os materiais de limpeza sujos pelo shopping, que eram nojentos, umas coisas apertadas sem reboco… 

Mas o mais interessante eram as fofocas e a própria dinâmica do shopping, um universo à parte.  Você fica sabendo, por exemplo, que o dono de uma das grifes mais caras do shopping quer fazer uma sacola bem vagabunda porque não quer ver nenhuma empregada doméstica sair por aí depois carregando a sacola, pois ele acha que isso é propaganda negativa. Mas essa mesma loja tem uma gambiarra na registradora que dá um jeitinho de registrar a venda sem emitir nota. Essa mesma loja também sonega mercadoria e abarrota tudo na caixa dizendo que tem bem menos peça lá dentro do que na verdade tem. Aliás, muitas lojas fazem isso. 

*Sempre que fizer compras no shopping exija a nota fiscal. Evite pagar com cheque, pois eles vão dizer que a máquina está com problema e não te darão a notinha. 

Ou seja, na minha cabeça é um bando de gente que faz coisa errada, mas não olha para o próprio umbigo e depois fica cagando regra. Eu, sinceramente, depois que saí desse ramo, vou ao shopping quando não tenho outra alternativa. Detesto o fato de que quase todos os cinemas de Brasília são dentro de shoppings. Passear e shopping são duas palavras que não deveriam ser usadas na mesma frase, não combina. Ele não é um lugar agradável. Cheio de luzes artificiais, plantas de plástico. Tudo brilha em excesso. É uma poluição visual e auditiva.

Mas infelizmente aqui nós não temos um centro onde você possa caminhar, sentar num banquinho e ver os pássaros e depois comprar o que precisa e pegar a roupa na lavanderia. Aqui fica tudo meio setorizado e nunca é muito simples resolver várias coisas de uma vez.

Mas voltando ao rolezinho, porque eles não podem? A cleptomaníaca não é a menina da periferia, o estelionatário não usa boné aba reta. Bagunça, baderna? Coloque 3 adolescentes que se conheçam da qualquer classe longe dos pais que o resultado será parecido. Mas porque eles não podem? Tudo que eles querem e ver e serem vistos. Quer dizer que o dinheiro deles não é bem vindo no seu shopping? A madame vai ficar com medo de um bando de adolescente que quer aparecer? O que ela, a madame, andou fazendo para ter medo? Será que tratou alguém feito lixo só porque era pobre ou estava numa situação inferior? Eu não sei, mas vejo muita sabedoria naquele ditado "quem não deve não teme". Porque esse povo tem medo? Medo do quê? 

Proibir o rolezinho ou os jovens de entrar no shopping eu sou contra. Eles podem fazer alguma coisa? Sim, podem. Mas eles também podem só querer estar lá. Não existe um princípio do direito que diz que você é inocente até que se prove o contrário? Ah, mas esse certamente não serve para o Brasil. Aqui você só tem o benefício da dúvida a partir de uma determinada classe.


quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Não se iluda, se você morar fora não será elite

Vendo a polêmica causada por aquele americano que detestou morar por aqui e um dado de uma pesquisa que diz que a maior parte da elite brasileira quer morar fora, eu resolvi escrever esse post, afinal, morei um ano fora do país e talvez possa dar um toque para aqueles que pretende sair, não se decepcionarem.

Eu acho que tudo depende para onde vai. Não posso dizer muito, mas para mim parece que os EUA são o Brasil com gadgets. O modo de pensar, o consumismo, a disputa e o classissismo que parecem existir nos dois. Afinal, o modo de vida americano parece muito com o brasileiro. As pessoas vão passear no shopping, todo mundo tem carro… essas coisas.

Eu vivi na Escandinávia, na Suécia, mais precisamente. O pior e o melhor lugar, na minha opinião para ter um gostinho do é o 1º mundo. Me desculpem os outros, mas depois dela a França, Inglaterra e outros me pareceram uma bagunça. Mas aí reside o problema, o lugar é tão organizado que sua vida não apresenta muitas surpresas. Inclusive você não pode deixar para programar o seu final de semana na semana que ele irá ocorrer, pois seus amigos já terão compromisso. Deixar para comprar bebida quando quiser beber também não. Só os ricos tem grana para beber no bar e a loja do governo, o único outro lugar autorizado a vender bebidas com mais de 4% de teor alcóolico tem horários bem restritos de funcionamento.

Outra coisa que é bom lembrar: você não poderá tratar os prestadores de serviço (garçons, motoristas de ônibus, vendedores, pedreiros e etc) como lixo, que nem trata no Brasil. É possível que a pessoa que esteja te atendendo fale pelo menos 3 línguas e tenha um mestrado. Eles também não irão tratar você como o Xá. É bem possível que, mesmo no restaurante, tenha que se servir de água e pegar os seus próprios talheres. Está mesmo preparado para isso? Pode ser um choque.

Muito provavelmente, se trocar o Brasil por um país mais desenvolvido, terá que andar de transporte público. Outro choque para o filhinho da mamãe que nunca pegou sol na moleira. Por melhor que seja, transporte público é transporte público. Isso significa que dificilmente irá sentar no horário de pico. Vai ter que exercitar as pernocas, pois em qualquer outro lugar do mundo, uma distância de 10min até a parada ou a estação não é nada. Mas eu desconfio que ser como todo mundo no exterior pode, só aqui é que não, afinal, no Brasil pobre não entra nem no shopping.

Ah, essa é muito importante: você provavelmente não terá nem empregada nem faxineira. Isso pode ser um tremendo susto para alguns. Terá que limpar a sua própria sujeira. Mas sempre pode viver como uma barata. A menos que você more numa república (o que é muito comum em vários países), nesse caso, talvez tenha que manter o decoro. Mas não se preocupe, os eletrodomésticos lá fora realmente funcionam. Os aspiradores de pó são uma maravilha e a máquina de lavar louça não é artigo de luxo.

Você não poderá quebrar a lei e colocar a culpa no governo. Se estacionar seu carro (ou bicicleta) em lugar indevido não ganhará o perdão do guarda só porque não tem onde estacionar perto de onde você vai. Na melhor das hipóteses, ele te dará uma advertência e ainda te mostrará o quão folgado está sendo, dizendo que poderia muito bem parar mais longe e ir à pé.

Esse é especial para as meninas: você provavelmente não fará a unha no salão toda semana. Provavelmente nem fará a unha no salão. Isso porque fazer a unha custa uns 20 euros. Eu, além de fazer a unha em casa, cortava o meu próprio cabelo, pois via os cortes da moda e ficava com medo de sair do salão com um mullet moderno.

Ah, outro toque para aqueles que se orgulham da tez branca: não, não é tão branca para eles. Provavelmente você ainda terá cara de gringo. Se não tiver cara, vai ter sotaque. E muito provavelmente vai entrar em contato com os estereótipos do brasileiro cedo ou tarde. Mesmo que seja depois de um ou 5 pints de cerveja. "Samba aí, brasileira", "Toma a bola, Pelé", "Você mora numa árvore?", "Conhece a Amazônia, ama o carnaval?"… Aí nessa hora você encontra o seu orgulho, que estava há muito tempo escondido e volta a ser brasileiro. Uma pena que precise disso. O seu sobrenome gringo e o seu passaporte não escondem de onde você vem. Sinto muito.

Por que eu voltei? Bom, não gosto da sensação de ser "estrangeiro" na minha casa. Tudo bem que pelo meu modo de pensar muitas vezes me sinta estrangeira no meu próprio país. Mas ainda tenho essa boba sensação de que posso fazer algo pelo Brasil, mas lá fora eu seria apenas mais uma girando junto com a roda, fazendo parte do esquema já montado, organizado. Aqui ainda há o que fazer. Para quem ainda não entende, cito meu pai:

"Você prefere ser o rei dos cachorros ou o cachorro do rei?"