terça-feira, 28 de outubro de 2014

Algumas reflexões sobre política

Não sou especialista no assunto, mas como posso votar, acho que tenho o direito de opinar. De fato, o voto é secreto e eu não precisaria anunciar minhas escolhas políticas na internet. Outro fato é que eu não votei nessa eleição. Também não me arrependi de não tê-lo feito.

Dizem que o Brasil está dividido e ressaltam que a diferença entre Dilma e Aécio foi de apenas pouco mais de 3 milhões de votos. Mas acredito que a diferença seria maior se pessoas como eu tivessem ido votar. Fico feliz e triste por Dilma ter levado essa. Eu até achei que ela não parecia muito animada em concorrer novamente. No início da campanha, me parecia estar cansada da política. Mas enfim, isso são apenas especulações.

Uma prima minha disse que queria saber porque eu voto no PT por ideologia. Dois erros nessa afirmação, eu não sou petista e não voto no PT por ideologia. Acho até que o PT não tem mais a mesma ideologia que teve no passado, mas é bom ressaltar que, por mais que os eleitores não tenham, todos os partidos políticos tem uma ideologia.

O humorado dicionário filosófico de Comte-Sponville diz que o termo ideologia significava a ciência das ideias e que seria então a ciência das ciências. Mas essa acepção caiu em desuso e o sentido que conhecemos hoje é o que foi dado à palavra por Marx. Esse seria:

 "a ideologia é um conjunto de ideias ou representações (valores, princípios, crenças...) que não se explicam por um processo de conhecimento - a ideologia não é uma ciência -, mas pelas condições históricas da sua produção, numa sociedade dada, especialmente pelo jogo conflitual dos interesses, das alianças e das relações de forças. É como um pensamento social, que não seria pensado por ninguém mas que pensaria em todos, ou melhor, dentro do qual todos, necessariamente, pensariam. A ideologia é inconsciente: ela é o lugar social e historicamente determinado de toda a consciência possível. É a linguagem da vida real. Ela é por natureza, heterônoma: sua história está submetida à da sociedade material, ela própria dominada "em última instância" pela infraestrutura econômica". 

O verbete se estende por mais 3 páginas, só para se ter uma ideia da tarefa complexa que se é definir "ideologia". Acho que a última parte é mais esclarecedora, as ideologias são próprias de uma sociedade. Eu diria ainda que cada segmento dela, devido a sua história, tem sua própria ideologia. Eu não me lembro se estudamos isso no segundo grau, mas em termos de política existem ideologias de esquerda e de direita muito parecidas. Por exemplo, se falarmos de extrema direita e extrema esquerda ou centro direita e centro esquerda. No Brasil temos uma certa dificuldade em entender essas diferenças também pela boa qualidade da nossa imprensa. Só para termos uma ideia, a notícia depois das eleições foi o que a capa dos principais jornais estrangeiros diziam sobre o nosso pleito. Os nossos realmente não tinham o que dizer. Pareciam estar esperando que os de fora lhes dissessem o que tinham que pensar.

Eu sempre me perguntei o que levava uma pessoa a ser de direita. Tive muita dificuldade em aceitar, até por preconceito. As ideologias de direita não pregam a igualdade entre os homens, por mais que digam serem todos os homens iguais perante a lei. Elas acreditam a liberdade de oportunidades, no estado mínimo, no livre comércio e no respeito a propriedade privada. Esse é um resumo, pois as ideologias tem muito mais do que isso. A direita não é necessariamente conservadora. E o grande atrativo dessa ideologia é a redução do estado, pois isso implica em redução da carga tributária. Mas na minha visão essas bandeiras acabam sendo conservadoras no sentido que se concentram em conservar privilégios de quem já está estabelecido quando se resolve "abrir" o comércio e reduzir o estado, deixando os mais fracos desamparados.

Muita gente da classe média é seduzido por essa proposta, pois a carga tributária tem um grande peso nessa classe, já que os mais pobres estão fora da faixa dos que pagam imposto de renda. O que muitos ignoram é que os mais pobres pagam proporcionalmente muito mais impostos, pois quase tudo o que consumimos é tributado no nosso país. Se levarmos em conta o gasto que uma família pobre tem com transporte, por exemplo, talvez seja muito mais alto do que uma de classe média gasta com imposto de renda. Mas quem se importa, não é mesmo? Farinha pouca o meu pirão primeiro. 

O que eu acho que as pessoas de direita ignoram é que a desigualdade social aumenta a violência. Além disso, contrario ao que muita gente acredita, é muito melhor uma sociedade onde a diferença entre ricos e pobres não é grande. Uma sociedade rica é aquela onde todos são ricos. Outra coisa que eu gostaria de comentar sobre o assunto é a famosa política "assistencialista". Todo mundo adora falar sobre o bolsa família, mas pouca gente gosta de se informar sobre o assunto. Alguns mitos merecem ser desfeitos. Nós não estamos dando esmola, o programa tem outras ações vinculadas a ele que funcionam como aperfeiçoamento e política de saída. Outra questão é o montante de dinheiro destinado a ele. Eu considero uma política direta e indireta. Tirar esse montante de pessoas da miséria ou da miséria absoluta tem consequências além da melhora na vida delas. Nós diminuímos gasto com saúde, reduz a violência, entre outros. De um certo modo o dinheiro não é só para eles.

O que muita gente não consegue entender é que isso é um exemplo de política direcional, na tipologia cunhada por Gøsta Sping-Andersen. Um governo falha em estender o estado do bem-estar social à todas as camadas da população. Direciona as políticas a uma só camada e acaba fazendo com que os setores da sociedade se desunam em vez de cobrar do governo que a política seja ampla. Exemplo, nem todos precisam do bolsa família, mas se a saúde fosse de qualidade, não seria necessário pagar um plano de saúde e todas as classes poderiam usufruir do sistema de saúde. O que muita gente acha é que o governo só ajuda a classe baixa. 

Só que no lugar de querer que todos tenham os mesmo direitos, muitos querem que os menos favorecidos sejam menos favorecidos ainda. A classe média, até certo ponto, pode arcar com um plano de saúde e fazer cortes para economizar no orçamento, mas como fazem aqueles que mal podem pagar uma cesta básica? É claro, a centro direita não é contra políticas sociais, mas pelo que eu já vivi até hoje, sei que o foco dela não é esse.

Qual o meu problema com a "livre iniciativa" e o "estado mínimo"? É histórica. Os países mais desenvolvidos do mundo não adotam mais essa política. E quando falo desenvolvidos eu excluo os EUA por 2 motivos: não conheço muito o que se passa lá e seu que a desigualdade lá é grande. Falo dos países europeus, pois conheço um pouco mais sobre eles, o Canadá e, infelizmente, não sei como a política funciona nos Tigres Asiáticos e no Japão, então ficarei só com os ocidentais acima citados. Os "avanços" da Inglaterra na era Thatcher são um bom exemplo do quão ruim o neo liberalismo pode ser. 

Reduzir o estado deixa uma lacuna. Quem pode pagar pelos serviços paga, quem não pode se lasca. Transferir para a iniciativa privada aquilo que o governo deveria fazer nunca funcionou no Brasil. Tem gente que pode argumentar que foi porque o modelo das agências reguladoras foi falho ou foi mal feito. Mas em alguma configuração seria diferente no Brasil? Voltando à livre iniciativa. O discurso é velho. Usam exemplos vitoriosos para dizer que todo mundo pode conseguir, mas esquecem que os vitoriosos são uma exceção e não a regra. Sem se lembrar também que os ricos tem mais oportunidades do que os outros. Ora, se pregam tanto a meritocracia, deveriam zerar as heranças familiares e a condição de vida de cada um para a competição ser justa.

Em resumo, é por isso que eu sou de esquerda. Poderia falar muito mais coisa sobre meu posicionamento, mas acho que uma hora é preciso resumir. E só para provocar, eu fico muito feliz com pessoas ricas e bem de vida serem de esquerda, a esquerda caviar, pois eles se beneficiariam muito mais com um governo de direita, mas mesmo assim, querem uma sociedade mais justa. Eu não. Estou mais para esquerda sardinha mesmo.