sábado, 11 de setembro de 2010

Preciso falar!

Sei que havia prometido e dito que ia postar meus contos no blog, mas uma semana lendo intensivamente sobre os mitos da maternidades motivaram minha recalcitrância. Preciso postar!

No meio do caminho, entre as leituras feministas e literárias, me perguntei "porque estou estudando maternidade?". Parece um tema tão batido. Se pararmos para pensar, Simone de Beauvoir já falava nela como principal "defasagem" feminina em relação aos homens. Podemos colocar na lista Badinter, Chodorow e recentemente eu descobri Aminatta Forna. Filosofia, psicanálise ou jornalismo, seja qual for a linguagem essas mulheres concordam que o amor materno é uma invenção. Aliás, as mulheres relutaram muito em "assumir o posto". Aproximadamente 200 anos. Para se ter uma idéia, a amamentação era teimosamente combatida pelas mulheres cultas do século XVI ao XVIII, mesmo com as enormes taxas de mortalidade dos bebês que ficavam ao encargo das amas. Além disso o discurso filosófico, moral e médico variava em obrigar ou não esse ato que hoje nos parece óbvio ser necessário.

Fato é que os homens "tiveram" que nos ensinar algo que nos é "natural". Eles sabiam o que era uma boa mãe desde Rousseua até Freud. Nós só engolimos os discursos, não com uma certa ânsia, como a História mostra. Se toda a mulher deve ser mãe, se tem um "relógio biológico" que fatalmente vai chegar a essa hora, porque ainda é preciso ressaltar as qualidades e recompensas de ser mãe? Ainda sofremos hoje com discursos semelhantes aqueles que circularam entre o séc. XVIII e XIX para nos fazer voltar ao lar e às funções domésticas.

Eu estou exagerando? Outro dia vi no jornal comentando sobre a extensão da licença paternidade e apenas 2 das 6 pessoas entrevistadas foram a favor. Claro que isso é um universo ínfimo, mas não sei se o brasileiro está muito convencido da importância do papel do pai no desenvolvimento da criança. Talvez só se ache que as obrigações paternas começam quando a criança começa a falar, andar e etc. Afinal, enquanto mama é só a mãe, certo? Bom, daí surge a desculpa esfarrapada da psicanálise que afirma que as crianças "precisam" da mãe na primeira infância para poderem ter ela como objeto de amor pelo qual vão se livrar na fase edipiana. Besteira. A taxa de mortalidade no parto das mulheres de antigamente não causou uma epidemia de psicopatas. Aliás, o cuidado exclusivo da criança pela mãe parece ser muito mais problemático para ambos. Se a separação é necessária para o amadurecimento, porque torná-la tão difícil fazendo a criança se afeiçoar apenas pela mãe? Bom, Aminatta Forna, que foi criada em Serra Leoa pelo que chama de "família extendida" onde todos os adultos da família, inclusive amigos, são responsáveis pelo cuidado das crianças, ela mostra como esse tipo de cuidado pode ser muito mais saudável para a mãe e a criança. A mãe pode trabalhar e ter tempo pra si e a criança tem uma melhor experiência de socialização desenvolvendo melhor as habilidades de convivência. Muitos antropólogos afirmam isso, mas insistimos em pregar a maternidade ocidental como única, verdadeira e certa.

O problema é que essa maternidade não mudou muito. As mulheres ainda são definidas como "mães em potencial". Outro dia fomos a um almoço de família eu e o Marcos. Numa mesa estavam os adultos e na outra as crianças (que já estão mais para adolescentes). mas na prática, a mesa dos adultos era a dos casais com filhos e para as pessoas que babavam por crianças. Nós nos sentamos na mesa das crianças, mas nos sentimos meio sem lugar pois somos velhos para eles, não sabíamos os nomes dos jogos ou desenhos que eles gostavam, mas também não estávamos por dentro do papo dos adultos, pois eu acho extremamente entediante esse papo de falar de criança. Os adultos sem filhos não tem lugar na mesa. Até conseguirmos falar de política ficamos excluídos. Até porque se você é casado e não tem filhos causa estranheza nos demais. As perguntas começam "Quando vem o de vcs?" ou podem ser ameaças como "Vcs são os próximos...". O que me intriga é que sempre ouço um deles reclamando de ter tido filho.

As mulheres, pelo menos as jovens mães que eu conheço, são dignas de pena. Não conseguem nem fazer o marido lavar uma louça carregam a casa e o cuidado com os filhos sozinhas. Quando eu falo que eu e o Marcos dividimos tudo em casa e que ele cozinha na maioria das vezes porque eu não gosto de cozinhar me olham como se eu fosse um ET. Eu quase perguntei como elas tiveram coragem de ter filho se não tinham outra pessoa para cuidar da casa ou dividir as tarefas. Mas eu sou a diferente e seria indelicado da minha parte dizer isso, afinal, existe um pacto de não questionar a "normalidade" das divisões de papéis em público. Em resumo, porque mostrar pra pessoa que a vida dela é uma merda e ela está sendo explorada? Nos casos em que conheço, as mulheres são capazes de compreender isso por conta própria, só não o fazer porque teriam que recomeçar do zero. É melhor fingir que se é feliz, afinal, a sociedade não discute que a mãe merece algum reconhecimento.

As revistas e programas de televisão até hoje se regozijam em mostrar mulheres que tinham uma carreira brilhante e decidiram abandonar tudo para ser mãe. Ninguém discute o porque uma união dessas parece impossível. Eu detesto ver na legenda de uma entrevistada o nome seguido de "mãe da fulana ou do fulano". Muitas vezes não aparece nem o nome, só "mãe do fulano". E sua magestade a criança aparece coroada e invariavalemente a mãe parece uma abestada. Muita gente vai falar que eu reclamo ou desdenho porque não sou mãe. Eu preciso ser? Porque? Depois que eu for perderei minha individualidade com medo de ser taxada de egoísta ou de uma mãe má? E se não gostar da função, faço o que? É um problema, pois dizem que mesmo que uma mulher não goste de crianças ela será "tocada" pelo amor materno quando tiver seu próprio filho. E se ela resolver testar e seu "botão" estiver estragado? Fará o que? Com certeza a tomarão por doente. Eu conheço casos assim. O pior, poderão acusá-la de golpe da barriga. Que teve o filho para "segurar" o marido. Imagina se num casamento uma criança chorando o tempo todo e precisando de cuidados quase o tempo todo pode ajudar em alguma coisa. Me parece meio estúpido.

Não discordo que exista amor nessa relação, mas como ele pode surgir, aflorar normalmente com a alta taxa de imposições feitas às mulheres? Mesmo eu que divido as tarefas as vezes me pego com as pressões sociais atuando na minha cabeça. A casa está bagunçada eu ouço um "vc tem que arrumar". Imagina quando se é mãe o quanto essas pressões não são mais fortes? Será que as mulheres querem ser mães ou acham que devem ser? Afinal, todos são hunânimes em dizer que devemos ter essa experiência antes que gastemos todos os nossos óvulos.