sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

O novo cortiço brasileiro

Também chamado de "novo conceito de habitação".

Quando Aluísio de Azevedo escreveu O Cortiço, em 1890 tinha uma preocupação em mente: relatar os problemas sociais daquela comunidade. É claro que o cunho realista-determinista da obra faz crer em alguns momentos que os problemas ali expostos são devido a natureza e etc. Confesso que não me lembro bem do romance, coisas da leitura impositiva. Lembro melhor do filme. E no filme o que mais me marcou foi a caracterização do próprio cortiço.

Eu, quando criança, morava num bairro que era por muitos considerado periferia. Muitas vezes não falava onde morava para meus colegas de escola por vergonha. É fato que sofria bem pouco bullying na escola, mas a vergonha era automática. A semelhança do cortiço com o bairro onde morava era a vida pública das pessoas: roupas dependuradas na janela, crianças chorando e principalmente; casais brigando no meio da rua, e principalmente o espaço pequeno que fazia com que parte da sua vida acontecesse fora da sua casa. As pessoas do cortiço tinham me lembrava muito o apê onde morava: 2 quartos, uma sala com 2 ambientes bem pequenos e uma cozinha que mais parecia um corredor onde não cabiam duas pessoas ao mesmo tempo. Meu apê era bem melhor do os quartos do cortiço, mas era muito apertado.

Recentemente fui olhar apartamentos para alugar em outra cidade, pois irei me mudar e não foi que toda essa sensação de viver num cortiço voltou a minha mente?! Os prédios são super "chiques"; tem garagem, espaço gourmet, piscina, sala de ginástica... E 3 quartos, uma sala, uma cozinha e 2 banheiros espremidos em 60 metros quadrados.

A justificativa para esses apartamentos compactos é que tudo aquilo que você não pode fazer na sua própria casa, você faz na área comum do prédio. Mas a minha pergunta é como? e pra quê? Se todos os moradores dos 38 andares e dos 76 apartamentos resolverem frequentar o espaço gourmet, a piscina, a sala de ginástica e etc nos horários livres (que para a maioria das pessoas é o mesmo), não vai caber. E bom, eu sou uma pessoa reservada. Ninguém parou para pensar que nem sempre você quer fazer a social com o seu vizinho? Claro, nem todo mundo usa esses espaços, mas mesmo assim, porque não tirar essas bobagens do prédio e aumentar uns 10metros quadrados dentro do apartamento? Porque a gente tem que viver numa gaiola? Porque não dá para colocar uma esteira dentro de casa sem ter que se livrar da cama?

Um dos prédios que eu visitei tinha uma lavanderia. A corretora me mostrou toda contente. Parece que isso está virando moda por aqui. Bom, eu já morei fora e lá é muito comum ter uma lavanderia comum por prédio. Onde eu morava tinha que marcar hora. Mas existem lugares que se a máquina está livre, pode ser usada. Isso parece muito bom, mas imagina se tem uma pessoa folgada que resolve ocupar todas? Ou você ter que ficar supervisionando a sua roupa para ninguém tirar ela da máquina antes de acabar de bater?

Onde eu morava, só o morador que tinha reservado a lavanderia para aquele período podia entrar lá, pelo menos. Mas para dar conta de toda roupa eu tinha que passar um dia inteiro lavando e colocando para secar. Não podia dar mole e perder o tempo do ciclo de lavagem ou secagem porque a máquina levava de 4 a 5 horas. A de secar, se perdemos o tempo, ela esturrica a roupa, claro, elas tem timer, mas como você acha que eu aprendi o tempo certo para cada peça? Em suma, é um saco porque você não pode colocar a roupa para lavar e ir fazer outra coisa. Pendurar quando puder.

Isso NÃO é vantagem. É bem melhor ter a máquina na sua casa. Sabe porque fazer isso? Se não tem máquina de lavar, não precisa de área de serviço e o apartamento fica cada vez menor. Se tem espaço gourmet, para que cozinha?

E no final, vamos morar todos em cortiços "conceituais"- Mouquifau Residence.