segunda-feira, 26 de abril de 2010

Caráter não faz curva

Essa foi uma das frases (boas) de impacto que eu ouvi certa vez da minha mãe e que nunca mais esqueci. Analizando os recentes acontecimentos políticos brasilienses eu não pude deixar de lembrar dessa divisa. O momento parecia-me pouco oportuno para lições de moral, mas fiquei com a idéia entalada na goela.

Era aula de inglês, e a turma era composta em sua maioria por pessoas que trabalham muito e reservam o sábado de manhã para estudar o idioma. Gente que não tem tempo durante a semana para ficar caçando texto na xérox da UnB, por exemplo. Quando um professor tem textos para passar aos alunos que não fazem parte de um livro, normalmente abre uma pasta numa copiadora e cada aluno pode ir lá e pagar pelo número de cópias que deseja. Rápido e prático. Estou falando de textos de autoria própria dos professores, sem direitos autorais e etc, pois essa questão de cópia de livro não é o tema do post.

Só que os alunos da minha turma de inglês aceitaram a sugestão do professor que não queria ter o trabalho de abrir uma pasta e entregou os exercícios para uma aluna que se ofereceu para tirar as cópias no trabalho dela. Cada um de nós de R$ 1,00 para a colega que servia eu não sei pra quê. Eu fiquei tentando entender se era para comprar a resma de papel ou pagar o trabalho dela. Também não consegui entender se ela era funcionária pública e com o preço da resma ia fazer surgir mais 3 resmas e criar cópias infinitas pra gente. Qual era de fato a vantagem?

Provavelmente ela é funcionária pública e vai colocar um estagiário para tirar as cópias pra gente. Como ela é muito honesta, vai repor o papel que gastou. Infelizmente ela esqueceu que a máquina de xérox gera mais gasto do que apenas o papel. Ela consome energia, tinta sem falar no tempo que ela usou e deixou de trabalhar (no caso dela mesma ter tirado as cópias) ou no tempo que o estagiário perdeu fazendo isso pra ela.

Se ela é uma funcionária de empresa privada, eu fico na minha e não penso mais nada. Mas no caso de ser uma funcionária pública não há vantagem nenhuma nesse esquema, pois quem paga as contas públicas sou eu, então eu estou pagando o salário dela para q ela fique gastanto o tempo numa máquina de xérox e provavelmente ganhando muito bem pra isso ou estamos gastando o salário de um estagiário que poderia estar fazendo algo útil e mais adequado numa atividade que não é a dele. Mas o pensamento das pessoas ainda é "se é público não tem dono". Foi isso que os políticos pensaram do dinheiro que puseram na meia, na cueca, na bolsa... É roubo. Quem rouba uma caneta, um estagiário, uma hora de serviço, rouba um milhão, 10 mil, os 10% do garçon, a vaga do idoso...

Mas ela tá sendo esperta, merece aplausos. Mas o políticos tbm foram espertos, bate palma pra eles \o/. Quem me garante que pessoas assim numa oportunidade dessas não fariam a mesma coisa? É por isso que eu me lembrei da frase "caráter não faz curva". Se vc usa o telefone do trabalho pra bater papo, se tira cópia de livro da faculdade no estágio, se leva o corretivo da mesa pra casa e etc, será que pode mesmo se encher de indignação contra a conduta dos nossos políticos? Era isso q queriam dizer com a frase: "a corrupção no Brasil é endêmica".

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Fases

Eu gosto quando começa a esfriar e parar de chover em Brasília. Sou muito friorenta, mas acho tão gostoso entrar debaixo das cobertas quentinhas quando se está com frio. Além disso o frio seco me faz tão bem. Sou uma pessoa com pressão baixa, e por isso funciono melhor no frio. Prova disso é que só essa semana escrevi um conto, pintei um quadro, fiz um poema, li 2 livros e ainda aprendi a fazer ratatouille. Tudo bem que a falta do Marcos contribue para que eu tente fazer um milhão de coisas para não sentir saudade.

Se bem que eu não sei se estou sofrendo de um surto criativo ou um ataque de ansiedade. Tudo o que TENHO que fazer anda parado. Eu estou há 3 dias tentando terminar o fichamento de um livro, mas o tema me aborrece. É um dedo na ferida. Fiquei triste quando li que até mulheres que tentam fugir do padrão acabam tendo filhos para diminuir as cobranças da sociedade. Fora que eu fico analisando minha relação com a minha mãe e a dela com a minha avó. Segundo a autora a mulher é sempre uma tríade Avó-mãe-filha. A mãe odeia a avó e tenta consertar na filha, mas é uma bagunça pq quando a vilha vira a mãe a mãe vira a avó e aí todo mundo se ama e se odeia e fica chata e legal... Ah!!!

No fundo estou sublimando o medo de me descobrir igual a minha mãe, afinal, uma coisa não tem como negar - somos mulheres.

domingo, 18 de abril de 2010

Entendendo de catástrofes naturais

Sempre que acontece uma catástrofe natural a mídia cai em cima. Muitas vezes eu critiquei esse comportamento, mas agora estou vendo a coisa toda por uma nova ótica. Eu não posso comparar o que aconteceu comigo ao drama de pessoas que perderam a família toda e tudo o que possuiam num terremoto ou uma enchente. Também não é esse o meu objetivo. Entendo um pouco mais toda aquela aflição e nervosismo das vítimas ou famílias que a televisão gosta tanto de mostrar.

O meu marido foi fazer um curso de uma semana na Dinamarca e voltaria pra casa essa segunda-feira. Como o curso era muito puxado, nos falamos apenas duas vezes por e-mail antes do vulcão se animar. Um belo dia eu entro então na internet, o dia do meu último post, e me deparo com uma foto de um monte de cinzas no jornal com uma chamada que vou tentar reproduzir aqui, mas sem a mesma fidelidade "Veja as lindas imagens do vulcão islandês que parou centenas de vôos no norte da Europa". E quando eu clicava para saber das notícias só apareciam as fotos da merda da geleira coberta de cinzas. Para a minha sorte, o Le Monde publicou informações tbm além de fotos. Acabou sendo pior, pois um cientista dizia que as cinzas poderiam ficar sendo expelidas por semanas meses e até anos. O resto da mídia se preocupou em contar a situação do tráfico aéreo na Europa e só colocar fotos do vulcão, porque afinal de contas, nem o tal do geólogo especialista em vulcões parecia ter algo de concreto para dizer.

Eu estava quase calma pensando que o maridão poderia ir de trem para Lisboa e de lá chegar em casa quando li novamente que todos os europeus tiveram a mesma idéia e os bilhetes já estavam esgotados. Mandei um e-mail pra ele pedindo que desse um jeito de me ligar pois eu estava mesmo preocupada. Se as cinzas causaram o caos será que a lava poderia fazer algum estrago? Ninguém dizia. Conseguimos nos falar na sexta e ele me tranquilozou um pouco. Não estava dormindo no aeroporto, tinha dinheiro pra emergências e estava bem. Mas ninguém sabia se o voo dele ia ser cancelado ou não. Desde então eu fico quase que de 4 em 4 horas olhando os sites para saber se tem algo de novo acontecendo. Uma coisa é um atraso de dois ou três dias, mas esse já dura 4.

Agora eu entendo então o que acontece com essas pessoas. Ficam querendo respostas, saber o que fazer, saber como aconselhar aqueles que estão no região afetada. Mas o principal é tentar falar. Vc não fica calmo com e-mails ou notícias do jornal. Quer ouvir a voz de quem ama, não adianta. Nessas horas a imprensa até ajuda um pouco, mas o problema é que na maior parte dos casos, ela parece tão perdida quanto todos nós.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Vamos falar do que interessa

Depois eu continuo a minha comparação. Vou preparar um texto mais elaborado pois percebi que há muitos enganos a respeito do feminismo e eu não quero contribuir pra isso. Mas hoje quero comentar algo que me parece muito estranho. A UnB está em greve (guerra) a 36 dias e não aparece nenhuma nota no jornal. O único lugar onde se pode obter informações sobre a greve é no site da universidade. O quê é uma sorte (ou azar), pois indica que o pessoal da secretaria de comunicação não entrou em greve.

Muitos alunos vem até mim pedir informação e no começo isso me irritava um pouco pois achava que era preguiça de procurar. De fato, também, mas quando o site da UnB foi inaugurado ele demorava semanas para ser atualizado. Eu mesma não pensaria em procurar as informações ali. A imprensa prefere revirar a vida do psicopata desde que ele nasceu ao deixar um espaço para informação. O que é mais grave é o motivo da greve. Uma briga entre o presidente e seu ministro, que parece ser quem usa as calças nessa história. Até mesmo a ministra do STF está tentando mandar no cara e ele sempre dá um jeito de enrolar. Essa briga me lembra uma história que eu fiquei sabendo do meu avô, que trabalhava no diário oficial. O JK fazia promessas e elas só teriam validade se publicadas no DO. Ele dava então um bilhetinho para o sujeito. Quando o sujeito saia da sala, JK ligava imediatamente para o meu avô dizendo "Vai chegar um cara aí com um bilhete meu, mas não é pra atender o pedido não."

Por isso eu acho que a UnB está mais do que certa em esperar a folha de pagamento certa, um decreto, uma lei e todas as garantias formais de que não será lesada. Outra coisa que me passou pela cabeça é se esse ministro tem alguma ligação com o Arruda. Porque se nós gostarmos de conspiração, essa seria uma muito boa. O principal foco de manifestação contra o governo do GDF são os estudantes da UnB. Fazendo uma greve vc dispersa quase que por inteiro o movimento. Até porque os estudantes estão mobilizados em apoiar os professores e servidores da universidade. É causa demais pra abraçar ao mesmo tempo.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Ser feminista é como ser baixinha (parte 2).

Respondendo ao comentário da minha amiga e continuando a discussão. A Mari disse: "Não acho que eu precise ser feminista pra "conquistar meu lugar ao sol". Pra mim isso é a mesma coisa de dizer que preciso ser religiosa pra acreditar em Deus." Eu adoro as anologias dela, mas as vezes não fica muito bom. Ser religioso e não acreditar em Deus é que é estranho. Ou ainda dizer que acredita em deus e é ateu é não conhecer as nomenclaturas.

As mulheres tem medo de serem feministas. A palavra é feia e assusta. "Que homem vai me achar sexy e interessante com um background desses?" Essa visão é interessante porque já começa errada. Vou usar o conceito do meu novo eleito, Bourdieu, para explicar. Quando Levi-Strauss (que muitas pessoas só conhecem por ter inspirado o nome da grife Levis) analisou os povos primeiros ele descobriu que as mulheres eram a moeda de troca no sentido de criar laços entre duas famílias. Mas ele acabou desconsiderando muito mais e aí o Bourdieu explica. As mulheres tem a função de agregar valor simbólico aos seus homens. O valor delas é serem capazes de elevar a virilidade de seu macho. Hoje em dia as coisas ainda funcionam assim. O fato dos homens não quererem se casar ou ter um relacionamento sério com uma mulher que tem controle da sua vida sexual e da qual todos sabem ter saído com muitos homens é uma prova de que esse pensamento continua vivo. Nenhuma mulher quer ser mal falada pois isso faz seu valor cair no mercado. Quem dá o lastro nessa mercadoria é o homem.

Digamos que ser feminista faz nosso valor simbólico cair pois lutamos justamente contra aquilo que agrega "valor de mercado" às mulheres. Todxs xs estudiosxs são muito clarxs em afirmar que esse valor é composto pela castidade, bons modos, beleza e etc. Uma coisa interessante é que eles não aparecem exatamente como foram criados, mas ainda vigoram. Por exemplo a castidade. A mulher não precisa ser virgem (alguns homens tem até medo, pois as mulheres já podem dizer que um homem é rium de cama), mas também não pode ser rodada. Na minha visão, e agora eu falo de uma postura intelectual e de vida, quando uma mulher diz que não é necessário ser feminista para querer ter seu lugar ao sol ela pode estar dizendo duas coisas:
- Tenho muito valor simbólico e por isso posso ter um homem poderoso e com isso pegar uma carona no poder dele e ter uma boa situação de vida e ser bem vista na sociedade ou;
- Não sei o que ser feminista significa mas todos falam mal e eu quero que os homens me tenham em alta conta. (isso acaba soando como "quero manter meu valor simbólico mesmo sendo uma mulher inteligente").

Para quem tem medo da teoria feminista ou ser pega lendo um "Segundo Sexo" (que é um pouco ultrapassado, mas é por onde quase todas nós começamos), vou dar uma dica. Virgínia Woolf é uma das escritoras mais aguçadas que eu já li e seu livro "Um teto todo seu" é uma das discussões mais interessantes que eu já li sobre a condição da mulher e o fazer literário. Para quem quer se iniciar ou falar mal eu sugiro que ao menos conheça algo. Outro texto clássico é o da Gayle Rubin "The traffic in the women". Quase me esqueci, temos a nossa representante. Marilena Chauí em seu livro "Repressão Sexual: essa nossa (des)conhecida".

continua...

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Ser feminista é como ser baixinha (parte 1).

Cheguei a essa conclusão depois de 3 anos sendo feminista e 27 sendo baixinha. Quando vc é baixinha é tratada quase como se vc fosse doente. Algumas pessoas pensam que a culpa é sua que não selecionou bem os genes na hora de virar zigoto (ou sei lá qual é a primeira fase). Tem aquelas pessoas que te dão dicas, se não para crescer, para parecer maior. Coisas bem inusitadas que vão desde usar sapatos de dragqueen até jogar todos os seus cintos fora pq encolhem a silueta. Mas o melhor mesmo são as pessoas que são burras a ponto de pensarem que vc nunca ouviu uma piada de baixinho (curiosamente essas pessoas costumam ser um pouco maiores do que vc). Para esses eu tenho 3 possíveis respostas: pelo menos eu não sou burra como vc; eu gosto de fazer pessoas mediocres como vc felizes, afinal ser um pouco maior do que eu é sua única qualidade; e a terceira é dar uma lista de apelidos melhores e mais criativos para que o imbecil se convença de que é impossível ele te ofender mais do que com o simples fato de existir.

Ser feminista é quase isso. Pode ser resumido em ter que responder sempre as mesmas perguntas. Infelizmente as pessoas nunca se informam antes e ainda tem em mente conceitos ultrapassados e uma visão preconceituosa do que é ser feminista. Para aqueles que acreditam que o feminismo é algo ultrapassado eu convido a assistir o jornal local e o nacional de qualquer emissora. Provavelmente vai ver alguma notícia de uma mulher morta pelo namorado, ex-namorado, marido, ex-marido ou apenas um homem que gostava dela e que levou um fora. Além desse tema procure ver alguma injustiça contra a mulher, uma adolescente presa numa cela com vários homens tendo que prestar "favores" sexuais a eles. Ou até mesmo uma pesquisa do IBGE, IBOPE, IPEA dizendo que as mulheres tem mais escolaridade, mas ganham menos e ocupam poucos postos de comando. Quem sabe até uma notícia relatando o fato de alguma mulher ter morrido após tentar fazer um aborto. Pode ser que tenha morrido ao dar a luz a um bebê anencéfalo, pois nesses casos, mesmo com o alto risco para mulher, somos obrigadas a levar a gestação adiante apenas por valores religiosos. Talvez ainda, ao ver uma notícia sobre alguma mulher que morreu fazendo uma lipo vc não consiga ver o que há de feminista aí, mas o fato dessas coisas ainda acontecerem afirma de que algo que não atingiu os seus objetivos não pode estar ultrapassado.

O fato da palavra feminista ainda carregar essa conotação negativa faz parte de uma tática que consiste em desqualificar o locutor desse discurso com argumentos inverossímeis e que não fazem parte da discussão (como por ex. chamar a feminista de feia, mal-amada) para que nós não tenhamos nem a oportunidade de defendermos o nosso argumento, afinal, depois de sermos ofendidas, a conversa vai mudar de rumo. O que eu quero dizer com essa "comparação" é que os homens tem especial interesse em desqualificar as feministas. Como suas esposas se contentariam com a falta de talento na cama, a inutilidade masculina nos assuntos domésticos, a ausência paterna na criação dos filhos se fossem feministas? Os homens teriam que crescer, amadurecer se as mulheres fossem feministas. É muito mais fácil ter uma Barbie dentro de casa que uma mulher feminista. É bem mais fácil ser uma marionete pois assim não se é questionada. Sem ser questionada sempre se tem a sensação de estar fazendo a coisa certa, o "natural". Afinal de contas, mulheres são seres frágeis e incapacitados que só servem para o trabalho doméstico e para a maternidade. Indivíduos são homens, mulheres são mães. Se vc está contente com essa situação diga "não sou feminista". Se não está, comece a se informar, pois o conhecimento é poder que quem tem poder não o cede de graça. Se vc quer conquistar seu lugar ao sol nesse mundo "masculino" seja feminista e não tenha vergonha de dizê-lo.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Talento ou esforço?

Eu sempre me pergunto isso. Será que tenho talento ou sou esforçada? Essa dúvida sempre me ataca na véspera de entregar algum artigo ou antes de uma apresentação. Leio outros artigos tão bem escritos e acabo me achando mirin. O mais importante nessa área acadêmica não é só o prazer pela coisa. Ela exige inúmeras habilidades de que somente agora eu descobri. Precisa-se além de um senso crítico aguçado, uma boa memória, bons contatos e sobretudo trabalhar com o tema certo. Eu na verdade tive motivações pessoais na escolha do tema. Mas não é também a literatura uma questão de gosto? O fato é que com essa escolha sempre fico na dúvida se tenho talento ou sou vítima da solidariedade das pessoas que trabalham com o tema.

Nós do feminismo estamos nadando contra a corrente. Muitos dizem que é um tema ultrapassado e blá, blá, blá. As muitas pessoas que trabalham nessa área são motivadas por experiências próprias. Eu acho isso fantástico. Muitos repetem que para mudar o mundo vc deve começar por vc mesma. Bom, aí está. Estamos tentando mudar a nossa vida e os ganhos não serão só nossos. Mas quando a teoria sai da academia e alcança a população? Ops, acho que mudei de assunto...

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Só pra dar o gostinho...

“(...) aux yeux des hommes, celles qui, rompant la relation tacite de disponibilité, se réapproprient en quelque sorte leur image corporelle, et, du même coup, leur corps, apparaissent comme non “féminines”, voire comme lesbiennes – l'affirmation de l'indépendence intellectuelle, qui se traduit aussi dans des manifestations corporelles, produisant des effets tout à fait semblables.”

"(...) aos olhos dos homens, aquelas (mulheres) que, rompendo a relação tácita de disponibilidade, se reapropriam de qualquer forma de sua imagem corporal, e, do mesmo modo, seus corpos, aparecem como não femininas, vistas como lésbicas - a afirmação de independência intelectual que se traduz assim nas manifestações corporais produzem efeitos parecidos."

Pierre Bourdieu. La domination masculine, p. 96.

domingo, 4 de abril de 2010

fuck the fashion!

A primeira vez que vi alguém usando uma camiseta com essa frase eu já era adulta. Mas se fosse adolescente eu com certeza estaria com uma igual na semana seguinte. Outro dia andei me lembrando de como eu era nessa fase e me deu uma certa saudade. Fui muito infeliz nesse período, como muita gente, mas não deixei de ser rebelde, um pouco CRUJ talvez.

O que me fez lembrar do período, apesar de não ter NENHUMA foto minha na minha adolescência na casa da minha mãe ou nos meus álbuns foi porque o Marcos perguntou como eu era. Eu não era gorda, como muitos dos meus amigos se lembram de mim, mas eu era peculiar. Vão dizer que eu era mal vestida, pode até ser, mas eu era feliz. Gostava de usar calças largas, camisetas de banda e tênis, mas não tinha nenhum all star. Eu acabava com aquela aparência esquizita porque as calças de skatista não tinham do meu tamanho, então eu pegava as do meu irmão, usava com um cinto e colocava as camisetas de banda (sempre tamanho único) por cima. Eu parecia mesmo um saco de arroz, mas não estava nem aí.

Escolhia as camisetas ou pela banda ou pela frase escrita. Lembro que uma vez chorei quando meu irmão perdeu uma camiseta minha do Raul que tinha a letra de "O canto para minha morte" atrás. Era uma camiseta rara. hehe Minha mãe ficava louca com esse meu jeito. Achava que eu era lésbica. E não só ela, muitas pessoas no meu colégio também. Eu acho que os boatos só se alcamaram no dia em que um dos meninos da minha sala encontrou comigo num show de rock acompanhada do meu namorado na época. A transição dessa fase para minha fase "adulta" não foi tão brusca. Comecei cortando meu cabelo, que chegava na cintura, abaixo da orelha e depois joãozinho. Fui trocando as calças largas por calças mais justas, bermudas, saias e hoje, vestidos. Sempre gostei muito de preto e ainda hoje ele predomina no meu guarda-roupas, mas cores bem diferentes das que eu costumava usar já aparecem, como rosa, roxo, vermelho e amarelo.

Mas eu sinto saudade daquela época. Com 50 reais comprava roupas para o ano inteiro. E apesar de muito gente dizer que eu melhorei, muitas vezes não me sinto especial e diferente (no bom sentido) como me sentia naquela época. Hoje talvez eu tenha encontrado uma explicação quando eu li o Bourdieu. Para ele a mulher é uma agregadora de valor simbólico, quanto melhor sua aparência e mais caras são suas roupas mais valor simbólico ela agrega ao seu marido. Ao olhar para mulher todos sabem qual a classe daquele casal, sua educação e etc. Ou seja, todo o nosso sacrifício é apenas e continua sendo para a sociedade, um mérito do nosso marido ou de qq outro homem que esteja em nossa companhia. Complexo. Pelo menos eu tenho a felicidade de poder trabalhar de calça jeans e tênis, por mais que os meus alunos me confundam com uma aluna.